Katia Rubio

Professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de "Atletas Olímpicos Brasileiros"

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Katia Rubio

Proteção à maternidade ainda é negligenciada no esporte

Não existe qualquer garantia às atletas que engravidam e precisam se afastar

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Em tempo de pandemia, acompanho com muita preocupação a precarização do trabalho, de forma geral e no esporte em específico. Trabalhadores de todos os níveis têm aceitado acordos que reduzem salários e benefícios em troca de uma estabilidade que pode ser estável somente até a próxima semana.

E há quem considere isso uma vitória. É certo que está difícil sobreviver, mas, como sempre, há quem lucre mesmo diante da miséria alheia.

O trabalho no campo esportivo é um tema quase tabu. Estigmatizada como ação de mercenários durante muitas décadas, a profissionalização foi atacada de diferentes formas.

Tomado como uma questão moral, o profissionalismo era atacado com o argumento de que o esporte era uma atividade nobre, quase religiosa ou divina, que deveria ser realizada por aqueles que quisessem oferecer a sua habilidade e excelência em troca da satisfação de um desejo de imortalidade.

Esse discurso, sustentado pelos dirigentes e cartolas que se locupletavam da estrutura das entidades esportivas, resistiu até que, habilmente, se alterou a carta olímpica. Obviamente, não no sentido de favorecer os atletas.

No campo prático, o que se fez foi regulamentar uma prática que já se mostrava rotineira e denominada "amadorismo marrom". Preconceitos à parte, sabia-se que os “presentes” recebidos por atletas nas renovações de contrato, que iam de carro zero até casa própria, já colocavam por terra o amadorismo hipócrita.

Adhemar Ferreira da Silva recusou receber de presente uma casa própria porque sabia que isso o levaria a perder seus títulos olímpicos e ao banimento do esporte.

Não foi o caso de Mark Spitz, que subiu ao pódio com um par de tênis Adidas pendurado ao pescoço com a clara intenção de agradecer ao apoio da empresa que o cobria de mimos, mesmo sendo proibido.

No Brasil, tentou-se regulamentar o esporte com ações como a lei Pelé e depois a lei Agnelo/Piva. Parecia, então, que havia chegado finalmente a vez dos atletas brasileiros. O verbo no condicional aponta que não foi ainda daquela vez. Isso porque apenas os atletas do futebol foram contemplados com um mínimo de direitos, deixando todos os demais abandonados à própria sorte. Os tempos atuais provam isso.

Não vou entrar no mérito da ação que leva os clubes de futebol a fazerem contratos mensais, porque Renata, Juca, PVC e Tostão fazem isso melhor do que eu.

Destituídos de direitos, são obrigados a recorrer de forma individual e isolada, e na Justiça comum, para garantir condições mínimas de trabalho. No caso das mulheres atletas, esse ataque ganha contornos sórdidos.

Além da dificuldade em garantir os direitos universais, não existe qualquer garantia às atletas que engravidam e precisam cumprir o tempo necessário ao recolhimento exigido pela gestação.

Não foi o caso da campeã olímpica de vôlei Tandara, que venceu uma ação, no Tribunal Superior do Trabalho, contra o Praia Clube, que reduziu seu salário a 0,5% do total recebido pelo direito de imagem na época da gravidez de sua filha Maria Clara.

Embora ela tenha defendido clubes como Minas Tênis, Osasco, Guangdong Evergrande (da China) e Sesc-RJ ao longo dos últimos anos, os vencimentos devidos pelo Praia Clube foram finalmente conquistados, após seis anos de processo.

Embora seja um direito constitucional, a proteção à maternidade ainda é negligenciada no esporte, o que leva muitas mulheres a adiarem ou negarem essa intenção. Tandara provou que, se o juiz de linha não faz seu papel, resta ainda confiar nas instâncias superiores. Que assim seja também para outras demandas esportivas e sociais que estão por vir.

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