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As eleições da discórdia na América Latina

Pleitos na região acontecem em contexto de crise multidimensional: política, econômica e sanitária

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Carlos Moreira

Doutor em ciências políticas pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), na Cidade do México.

Recentemente, o famoso cientista político Adam Przeworski afirmou que o que ele mais gosta nas eleições é que elas põem em marcha mecanismos que "permitem processar conflitos políticos em paz e liberdade”.

Ele gostará, então, da série de eleições que esperam os latino-americanos em 2021: cinco eleições presidenciais –Peru, Nicarágua, Chile, Honduras e o segundo turno no Equador–, pelo menos quatro eleições subnacionais –Bolívia, Paraguai, Chile e México–, duas eleições legislativas –México e Argentina– e uma eleição constituinte no Chile.

Eleições contra o vento e a pandemia e para todos os gostos. E todas elas num contexto de crise multidimensional: política, econômica e sanitária.

O mal-estar na democracia

O acadêmico latino-americano Manuel Alcántara considera que a democracia latino-americana está "fatigada".

O estado de ânimo dos cidadãos do continente revela irritação com os partidos políticos e uma falta de confiança generalizada nas instituições políticas.

O coquetel inclui descontentamento com o modelo neoliberal de sociedade, resistência em aceitar medidas de ajuste governamental e cansaço com a corrupção dos líderes políticos.

Na região sobram exemplos para descrever esse (mau) humor social. O carrossel de protestos nos países do Pacífico sul-americano, de outubro de 2019 a novembro de 2020, é um exemplo disso. Embora os casos mais destacados sejam os do Chile, Equador e Peru, eles não são os únicos.

Nesse mesmo período houve mobilizações em todos os países em que serão realizadas eleições neste ano: El Salvador, Bolívia, México, Paraguai, Argentina, Nicarágua e Honduras.

As revoltas são indício de uma crescente crise regional de governança que é espantosa.

O que são revoltas populares se não sinais de instabilidade política? E esses sinais estão presentes na maioria das democracias, sejam elas semiformadas ou consolidadas.

Em qualquer caso, não é surpreendente que esses sinais apareçam nas primeiras, mas que apareçam nas segundas, como no caso do Chile. Ali, diante da explosão social, o presidente Piñera saiu para proclamar aos quatro ventos: "Estamos em guerra contra um inimigo poderoso".

O presidente do Chile, Sebastián Piñera, é vacinado contra a Covid em Futrono, sul do país
O presidente do Chile, Sebastián Piñera, é vacinado contra a Covid em Futrono, sul do país - Marcelo Segura/Presidência de Chile/Xinhua

Agora, neste mar de mobilizações antipolíticas, o confronto de ideias e propostas programáticas naufragou. O debate público foi reduzido a posições polarizadas dentro do eleitorado.

No caso do Equador, o segundo turno será resolvido entre correístas e anticorreístas, e nas eleições legislativas em El Salvador o principal confronto foi entre bukelistas e antibukelistas.

Nos outros países com processos eleitorais iminentes, do México à Argentina, o mesmo padrão se repete.

Em síntese, metade do continente elegerá seus representantes num contexto político marcado pela polarização e pelo personalismo, e com "que saiam todos " retumbando nas ruas. A trama será tecida com fios de ceticismo e incerteza.

Em que momento o nosso continente se complicou?

A segunda dimensão da crise regional –e não menos chocante– é a econômica.

Na campanha para o primeiro turno eleitoral no Equador, a geração de emprego e ajuda social para as famílias afetadas pela pandemia foram as propostas centrais do candidato do correísmo, Andrés Arauz.

Em El Salvador, as eleições foram um momento chave para os planos anticrise do presidente Bukele.

O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, durante votação em San Salvador
O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, durante votação em San Salvador - Jose Cabezas - 28.fev.2021/Reuters

Considerando que cerca de 45% do PIB regional depende do comércio exterior de bens e serviços, a queda no preço dos hidrocarbonetos afetou fortemente países como a Bolívia e o Equador.

Por sua vez, Chile e Peru foram atingidos pela redução do preço dos minerais que constituem suas principais exportações (cobre, lítio e iodo), enquanto que Argentina e Paraguai sofreram com a contração dos preços e volumes exportados de bens agropecuários.

Os países latino-americanos terminaram o ano de 2020 entre lamentos e inquietação: problemas fiscais e o aumento do desemprego, a informalidade –que já alcança a metade dos trabalhadores, podendo continuar a piorar– e a pobreza.

A contração do PIB regional foi de 7,7%, e os prognósticos para os anos 2021 e 2022 preveem uma recuperação modesta de 3,7% e 2,6%, respectivamente. Os ganhos sociais das últimas duas décadas pararam, e a possibilidade de uma repetição de outra década perdida está perigosamente próxima.

Votar em tempos de pandemia

No primeiro ano da pandemia de Covid-19, a América Latina ultrapassou 20 milhões de infectados e 600 mil mortos, expondo as inadequações do sistema de saúde pública.

Como a crise sanitária afetará as próximas eleições? De três maneiras.

Por um lado, a pandemia influenciará a participação dos cidadãos. As campanhas serão desenvolvidas por meio de redes sociais digitais, e espera-se que os jovens das áreas urbanas, que estão entrando na política em grande parte graças à digitalização, sejam os mais ativos e numerosos protagonistas.

Por outro lado, a emergência sanitária afetará a realização de pesquisas, e é possível que os prognósticos sejam menos certeiros do que o normal, o que poderia levar a uma crise na confiabilidade das pesquisas.

Finalmente, as campanhas de vacinação começaram e é pouco provável que sejam deixadas de fora dos debates eleitorais.

Desde o cronograma e os beneficiários até a procedência das vacinas, eles formarão um grande pomo de discórdia, onde alguns se apresentarão como pais responsáveis diante dos cidadãos inocentes e outros como salvadores da pátria com suas cortes de funcionários e assessores de saúde.

Até o momento, as crises econômicas e de governança dominam o debate.

Uma má gestão da saúde não significará necessariamente perder as eleições. Mas à medida em que este segundo ano da pandemia se desenrola, a dimensão sanitária da crise pode tornar-se um fator determinante em diferentes países. Tudo dependerá da igualdade de acesso à vacinação.

Tradução de Maria Isabel Santos Lima

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