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A tarifa de carbono e a agenda latino-americana

É preciso reconhecer e mobilizar os governos latino-americanos para conter o problema climático

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Leonardo E. Stanley

Economista e pesquisador no Centro de Estudios de Estado y Sociedad (Cedes), na Argentina

Julieta Zelicovich

É professora da Universidade Nacional de Rosário (Argentina). Diretora do grupo de estudo sobre Negociações de Comércio Internacional. Pesquisadora-assistente do Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Técnica

De acordo com o último Relatório de Risco Global (WEF, 2020), os aspectos climáticos estão entre os cinco maiores riscos que a economia mundial deverá enfrentar no futuro. O relatório visa considerar os efeitos associados a dois episódios. Por um lado, o surgimento de "cisnes verdes", como são denominadas as crises financeiras provocadas pela mudança climática e que afetam o sistema sócio-político. Por outro, a imposição de novas barreiras ao comércio com base na pegada de carbono.

A pegada de carbono e as novas barreiras ao comércio

A emissão contínua de gases de efeito estufa (GEE) no último século tem gerado um aumento na temperatura média do planeta. A gravidade deste fenômeno tem sido fundamental para avançar com a introdução de uma série de mecanismos de mercado em nível global, regional e local.

Em particular, os mecanismos de preços vêm ganhando adeptos, embora desde seu início exista uma forte dispersão. Estes mecanismos pré-determinam os níveis de emissões permitidos e buscam, junto com um impacto ambiental positivo, estabelecer um caminho para a reconversão.

Seguindo este objetivo, em 2005 a União Europeia introduziu um Esquema de Comércio de Emissões (ETS - EU), que funciona segundo o princípio de “limitação e comércio”. Este mecanismo impõe um limite máximo à quantidade total de emissões (decrescente com o tempo) abaixo do qual as empresas podem negociar seus excedentes. A redução gradual do limite encarece o preço, o que deveria induzir investimentos em tecnologias limpas.

Atualmente, a tonelada de carvão é de cerca de 50 euros, com um recorde de 56,90 euros em 14 de maio. A Europa tem impulsionado a inclusão da perspectiva ambiental de maneira transversal a suas políticas públicas, incluindo o comércio. Assim, em fevereiro de 2021, Bruxelas lançou seu plano para uma “política comercial, aberta, sustentável e firme”, no qual promove uma adequação dos instrumentos comerciais à transição global “para uma economia climática neutra”. Também avança com a instauração do Acordo Verde (EU Green Deal), comprometendo-se a alcançar a neutralidade climática em 2050.

O que é o ajuste de carbono na fronteira?

Tudo isso fala de uma ação muito ambiciosa em matéria climática. É nesta direção que se enquadra a ideia de introduzir um mecanismo de ajuste de carbono na fronteira, conhecido como CBAM por sua sigla em inglês. Esta política, embora seja pensada no marco da busca da neutralidade de carbono, também tem amplas implicações geopolíticas.

O Parlamento Europeu propôs a inclusão imediata dos setores de cimento, aço, alumínio, refinarias de petróleo, papel, vidro, produtos químicos, fertilizantes e eletricidade, considerando o conteúdo de carbono nos produtos intermediários, assim como no produto final. Os importadores seriam obrigados a comprar um certificado cujo valor se associa ao adotado no ETS-UE. Assim, o CBAM não apenas equilibraria os preços domésticos com os de importação, mas também evitaria ser rotulado como discriminatório. Por outro lado, ao qualificar como um mecanismo de ajuste de fronteira, o CBAM pode ser aprovado a nível comunitário.

Além dos objetivos econômicos –evitar a “fuga de carbono”– e ambientais –reduzir o nível de emissões globais– a UE também procura estabelecer um patamar para os padrões internacionais. Assim, o CBAM acaba por condicionar os espaços políticos dos parceiros extrazona e liderar o “clube do clima”.

Mas, enquanto alguns países poderiam eventualmente aderir, outros se opõem diretamente. Os Estados Unidos estariam no primeiro grupo, embora, por enquanto, a administração democrata se mantenha cautelosa. O Japão poderia eventualmente aderir e a Rússia se mostra mais reticente. A China, por outro lado, considera o esquema uma barreira comercial destinada a prejudicar sua ascensão, uma visão compartilhada pelas principais economias emergentes como Brasil, Índia e África do Sul.

E as necessidades dos países em desenvolvimento?

As críticas também apontam a inconsistência que tal normativa teria com as regras consagradas pela Organização Mundial do Comércio, incluindo a importância de considerar as necessidades especiais dos países em desenvolvimento. É discutível se o CBAM cumprirá estes dois requisitos porque a decisão seria adotada quando as indústrias dos países desenvolvidos já tivessem iniciadas as transições para a produção descarbonizada.

Qualquer resolução que seja finalmente adotada será política. Vale lembrar o estrondoso êxito dos partidos verdes europeus nas eleições de 2019 e seu efeito na decisão tomada pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, de avançar com o imposto. Que as autoridades de Beijing decidiram lançar seu próprio mercado de carbono não só reflete um maior compromisso ambiental, mas também responde ao lugar que as empresas chinesas agora ocupam nos mercados globais de energia renovável.

Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, anuncia plano em Bruxelas - John Thys/AFP

Independentemente da probidade do regulamento, se aprovado, o esquema afetaria países sem regimes de emissões ou onde as licenças são negociadas a valores muito baixos. As exportações de cimento da Colômbia ou da Venezuela, ou as exportações de aço do Brasil poderiam enfrentar um custo maior, assumindo uma externalidade que até agora favorecia sua equação empresarial.

Mesmo que a pandemia tenha acelerado a introdução do esquema, podemos dizer que a ideia não é novidade. Se implementado, seus efeitos serão globais. A projeção desigual da recuperação econômica pós-pandêmica acrescenta elementos significativos para a avaliação dessas políticas. Entretanto, uma adoção precipitada, sem contemplar os desequilíbrios globais, poderia acabar consolidando uma nova geoeconomia.

O que é claro é que, embora os modos deste processo –quem, quando e como as regras são feitas– possam ser questionáveis, sua implementação futura parece inevitável. Os países latino-americanos não podem ignorar ambos os componentes e, ao mesmo tempo, lutar por mecanismos de governança mais equitativos. Devem colocar outros recursos na agenda para reduzir a lacuna de desenvolvimento associada à mudança climática.

Nesta agenda incluímos financiamento e transferência de tecnologia, mas também a consistência das políticas macroeconômicas atuais (políticas de investimento e energia) com suas consequências futuras, mais sustentáveis a partir do compromisso ambiental. Tudo isso levanta a necessidade de reconhecer o problema e mobiliza urgentemente os governos latino-americanos para conter o problema climático.

* Tradução do espanhol por Maria Isabel Santos Lima

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