Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Descrição de chapéu Partido Republicano

Republicanos se importam com defesa da vida quando papo é aborto, não ataques a tiros

Massacres em escolas são rotina chancelada por conservadores americanos

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Hoje deve ser um dia como qualquer outro nos EUA. Não importa se hoje é quarta-feira. Ou quinta ou sexta. Se hoje for um dia comum, antes da meia-noite 123 americanos podem morrer a tiros.

Pouco mais da metade —54%— deve se suicidar, 43% serão vítimas de crimes e os outros 3% das mortes serão acidentais, ainda que previsíveis num país com 120 armas de fogo para cada 100 habitantes.

Por que amanhã deve ser um dia como hoje? Porque essa normalidade grotesca e única no mundo está garantida pelo Partido Republicano. E, claro, pelos eleitores que colocam no poder degenerados como o governador Greg Abbott, do Texas, estado que concorre com a Flórida pela liderança em massacres.

Policial caminha em frente à escola de ensino fundamental Robb, em Uvalde, no estado do Texas
Policial caminha em frente à escola de ensino fundamental Robb, em Uvalde, no estado do Texas - Allison Dinner/AFP

Ignore o falso luto do governador texano pelo massacre na escola de Uvalde, que deixou 21 mortos, entre os quais 19 crianças de 10 anos de idade ou menos. A palavra concorrência aqui é precisa. O próprio político escreveu no Twitter, em 2015, que estava numa competição: "Estou envergonhado: Texas, nº 2 no país em compras de novas armas, atrás da Califórnia. Vamos acelerar isso, texanos. @nra". A arroba é uma referência à NRA (National Rifle Association), lobby das armas de fogo que tem Greg Abbott no bolso.

Em setembro do ano passado, Abbott comemorou uma lei insana que permite a qualquer um portar armas abertamente em qualquer local, sem permissão especial ou treinamento. Porque ir ao supermercado ou a um parque cheio de crianças com um rifle automático pendurado no ombro é normal.

Uma clara maioria da população do Texas é contra a lei chancelada por Abbott. Mas, nos EUA, não só os massacres são normais, como um dos dois partidos tem como estratégia política de longo prazo governar para uma minoria cada vez mais reduzida e mais radical. Ignore as preces que o repulsivo senador Ted Cruz pediu pelas crianças mortas, cujos pais tiveram que dar amostras de DNA à polícia de Uvalde, porque seus rostos tinham sido destroçados pelas balas do assassino.

O autor do massacre, que, antes atirou na avó em casa, precisou de apenas uma semana, depois de completar 18 anos, para comprar legalmente duas armas automáticas e munição suficiente para dizimar a maior parte dos 535 alunos da escola. A normalidade se torna ainda mais banal quando descobrimos que ele exibiu orgulhoso a foto dos dois rifles em seu perfil no Instagram, junto com o recibo da compra.

A postagem não despertou alerta na plataforma do grande facilitador da propagação de violência Mark Zuckerberg. Pouco antes da matança, o atirador enviou mensagens privadas pelo Facebook anunciando seus crimes: "Vou matar a minha avó", escreveu na terça (24). "Atirei na minha avó," postou, em seguida. E a postagem final –"Vou atirar numa escola"– foi publicada 15 minutos antes de começar o massacre.

Na normalidade idealizada pelos republicanos, a única vida que merece proteção é a que dura nove meses no útero de uma mulher. Depois, se esta vida for extinta por desnutrição, falta de assistência médica ou balas de fogo, a palavra de ordem é denunciar os críticos como socialistas em pacto com satanás.

Reprodução do perfil em rede social de Salvador Ramos, atirador que matou 21 pessoas em ataque a escola no Texas, nos EUA
Reprodução do perfil em rede social de Salvador Ramos, atirador que matou 21 pessoas em ataque a escola no Texas, nos EUA - 24.mai.22/AFP

Na sexta (27), a NRA vai abrir sua convenção em Houston, no Texas. Espera-se um desfile dos políticos que a organização comprou, como Ted Cruz, Abbott e o gângster-chefe, Donald Trump. Mas quando Trump discursar, o evento vai se tornar distinto do resto do Texas. Vai ser proibido entrar armado na convenção.

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