Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães
Descrição de chapéu guerra israel-hamas

Guerra Israel-Hamas divide os EUA como nenhum outro conflito deste milênio

Incidentes de ódio e fantasias de violência ampliadas online parecem ser dardos aleatórios à procura de alvos

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O risco de um ataque terrorista contra os Estados Unidos é o mais alto desde a onda de atentados promovida pelo Estado Islâmico (EI) na década passada em razão da guerra Israel-Hamas. O alerta, que não surpreende ninguém, foi feito na terça-feira (31) pelo diretor do FBI, a polícia federal americana, Christopher Wray, em depoimento ao Senado.

Depois dos ataques do 11 de setembro de 2001, Nova York montou uma força antiterrorista sem paralelos nos departamentos de polícia de outras grandes metrópoles, a ponto de ter sido apelidada de uma mini-CIA (como é chamada a agência de inteligência dos EUA) em razão dos recursos de inteligência que pôs à disposição de 1.500 policiais e agentes.

Ato em favor da Palestina em Bay Ridge, no Brooklyn, em Nova York, área com grande população de origem árabe
Ato em favor da Palestina em Bay Ridge, no Brooklyn, em Nova York, área com grande população de origem árabe - Spencer Platt - 21.out.23/Getty Images/AFP

Mas não há inteligência capaz de prevenir crimes de ódio isolados nesta cidade com a maior população judaica fora de Israel —1,6 milhão— e a maior população muçulmana dos EUA, de 1,5 milhão. A tensão é evidente e é inflamada pelas redes sociais.

O ataque do Hamas a Israel em 7 de outubro e a subsequente reação militar israelense estão dividindo a cidade e o país como nenhum outro conflito deste milênio. Os incidentes de violência espontânea se multiplicam. Uma passageira esperava o metrô no centro de Manhattan quando levou um soco na cara de um estranho "porque você é judia", explicou na hora o agressor, preso dias depois. Um adolescente da minoria indiana sikh, frequentemente confundida com muçulmanos, foi esbofeteado dentro de um ônibus por usar turbante.

Nas universidades, as hostilidades entre alunos e professores criaram um clima de intimidação para forçar à absurda escolha de um lado. No norte do estado, um estudante de engenharia foi preso depois de ameaçar matar alunos judeus da Universidade Cornell.

A popular deputada democrata Alexandria Ocasio-Cortez foi atacada por destacar, pelas redes sociais, a importância de separar os povos de seus governos e por argumentar o óbvio, que defender direitos humanos de palestinos é moralmente incompatível com ódio antissemita.

A diversidade étnica, a densidade demográfica e o protagonismo de Nova York contribuem para que a cidade reflita conflitos internacionais. Mas parece haver um novo apetite por violência insuflado pelo governo Trump, a pandemia de Covid e os protestos do Black Lives Matter de 2020, tudo agravado pelas conspirações e desinformação epidêmica servidas por bilionários de mídia como Rupert Murdoch e o maldisfarçado antissemita Elon Musk.

Ter testemunhado o medo de retaliação e o preconceito que atingiram as comunidades muçulmanas nos meses seguintes ao 11 de setembro me faz indagar como Nova York teria emergido daquela tragédia se ela tivesse acontecido no presente.

Enquanto escrevo, ouço as risadas dos filhos ou netos de vários de meus vizinhos, judeus ortodoxos, no pátio de uma yeshivá, escola religiosa, a metros da minha janela. Penso no previsível temor dos pais caminhando neste bairro à noite, facilmente identificáveis pela indumentária.

Não é possível justificar a carnificina de civis a que estamos assistindo diariamente sem abdicar da própria humanidade. Mas os incidentes de ódio e as fantasias de violência ampliadas online, longe de Gaza, parecem ser dardos aleatórios à procura de alvos.

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