Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

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Luís Francisco Carvalho Filho

Escândalos sobre escândalos

O país é empurrado para o abismo de duas vertentes populistas

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Ser ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, político profissional que convive com milicianos, admira torturadores, protege policiais assassinos e conspira contra povos indígenas, gays e florestas, não 
é ambição de humanistas.

O cargo atrairia juristas de meia tigela e tiranos de ocasião, incapazes de lidar com o significado da Constituição e das cláusulas pétreas.

Sergio Moro, poderoso e venerável juiz federal, tinha o capital político de ser justiceiro eficiente, civilizado e discreto. 

Seus pecados —e não são poucos— eram relevados pelos tribunais e pela opinião pública. Implacável contra a corrupção, a cadeira de magistrado protegia a fama e cevava a credibilidade.

Chamado para o coração do governo, a vulnerabilidade ética de suas atitudes atuais e passadas se acentuou. Ele condenou Lula à prisão, o adversário eleitoral do próprio chefe. Um escândalo em si mesmo.

Ao aceitar o convite bolsonarista, Moro ficou mais suscetível à curiosidade crítica do jornalismo e direcionou holofotes para a própria carreira.

O vazamento da comunicação estreita entre Sergio Moro (juiz) e Deltan Dallagnol (procurador da República, parte acusadora no triângulo processual) cobre de desconfiança a imagem de bom-moço e o perfil técnico e provinciano do julgador.

Difícil cravar o resultado do litígio político. Sequestrar diálogos privados de autoridades é delito repugnante e perigoso. Mas é papel da imprensa fazer o escrutínio do que é mazela, do que é virtude, do que é de interesse público no conteúdo das falas que vieram à tona pelo site The Intercept Brasil.

Comunicações entre procuradores têm, em princípio, importância reduzida. São estratégias mais ou menos impróprias —de perto nada é normal— ou conversas de comadre, como a revolta nascida da notícia da entrevista de Lula para a Folha, censurada pelo STF.

Sim, responsáveis pela apuração dos delitos petistas na Petrobrás têm preferências partidárias, mas diálogos de membros do Ministério Público alinhados ao PT também mostrariam desvios de rota.

Já o bate-papo entre Moro e Deltan fere o sagrado valor da imparcialidade judicial. Interfere, em tese, no resultado de julgamentos criminais.

Dois blocos se movimentam no Supremo Tribunal Federal. Onze ministros decidirão o que vale e o que não vale como prova no estrondoso baú do vazamento.

Gilmar Mendes acena com a validação da prova ilícita, admissível para absolver, jamais para condenar. Marco Aurélio não vê em Moro vocação para o cargo de juiz. Luís Roberto Barroso (do time da Lava Jato) tem “dificuldade de entender essa euforia” que favorece corruptos.

Mas a palavra adequada é espanto. Parece enredo de ficção com notas de falência econômica e do insuperável e constrangedor abismo oferecido pelas duas vertentes populistas.

Lula não explica as relações promíscuas que manteve com empreiteiros nem o assalto franco do partido aos cofres públicos. Perseguido pelas elites por amar, conduzir e proteger o povo, aposta no sebastianismo político: a santidade como alternativa de poder.

Bolsonaro investe no panorama de uma “nova política”. Deus acima de tudo, promete reerguer o país historicamente desconstruído pela ladroagem e pela ideologia esquerdista.

Sergio Moro, sem saber conjugar o tempo moral dos verbos ser e estar, veste camisa do Flamengo para colher aplausos em estádio de futebol e agravar a enfermidade institucional do Brasil.

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