Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

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Corporativismo e misoginia em decisões judiciais são espantosos

Entidades atuam para proteger jornalistas reprimidas, silenciadas ou constrangidas

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A jornalista Schirlei Alves, do site The Intercept Brasil, foi condenada a um ano de prisão e ao pagamento de indenização (nada módica) de R$ 400 mil para reparar a suscetibilidade ferida de juiz e de promotor de Santa Catarina, no contexto do constrangedor caso de Mariana Ferrer.

A desproporção corporativista dos acontecimentos é espantosa.

O juiz, beneficiário da indenização, receberia, na mesma semana, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, a pena modesta de "advertência", por permitir a humilhação judicial da vítima do processo instaurado para apurar estupro de vulnerável –o objeto da reportagem considerada ofensiva pelo parceiro de toga.

A autoridade sai ilesa, a jornalista castigada. Não é a primeira vez.

Imagem em primeiro plano mostra Mariana Ferrer olhando para frente e sorrindo.
Influenciadora digital catarinense Mariana Ferrer - Reprodução

Em caso que começou a tramitar em 1995, Debate, semanário de Santa Cruz do Rio Pardo, interior de São Paulo, foi condenado a pagar a magistrado local, por danos morais, valor equivalente a dois anos e meio do faturamento bruto da empresa editora. O jornalista escarafunchou benefícios de moradia recebidos pelo juiz.

A decisão (tornou-se definitiva em 2002) ameaçava a existência do único jornal da cidade. Julgador e ofendido eram colegas de profissão e vizinhos de sala.

Schirlei Alves teve a ousadia –ou petulância– de cunhar a expressão "estupro culposo" para explicar a absolvição do réu. Se a reportagem é enviesada ou imprecisa, não é bonito perseguir jornalistas por metáforas ou por visão feminista do episódio.

O promotor do caso da Mariana Ferrer, Thiago Carriço - Divulgação

Em 2009, ao declarar a incompatibilidade da Lei de Imprensa editada pela ditadura militar (1967), o STF estabeleceu princípios imperturbáveis de liberdade. A "excessividade indenizatória" é "poderoso fator de inibição", de autocensura, alerta o tribunal. Em relação a agentes públicos (como são juízes e promotores) injustamente ofendidos, "subjaz à indenização uma imperiosa cláusula de modicidade".

Certas ou errados, de forma deliberada ou circunstancial, não importa, jornalistas exageram, erram e se enganam com frequência. Faz parte das regras do jogo. Repórteres incomodam porque revelam o que autoridades gostariam de ocultar.

Para o STF, quando o agente estatal não prima pelas aparências de legalidade e legitimidade, "atrai contra si mais fortes suspeitas de um comportamento antijurídico francamente sindicável pelos cidadãos".

A censura é misógina, mesquinha, e os casos se multiplicam. Funcionários, políticos, governantes e celebridades movimentam o Judiciário e as redes sociais com propósito especial de perturbar, por ameaça ou assédio, a atuação profissional de jornalistas mulheres.

Pesquisa patrocinada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo informa que 56,76% dos ataques virtuais contra jornalistas em 2020 eram direcionados a mulheres.

O governo do ex-presidente Jair Bolsonaro era, de fato, especializado nessa modalidade de perseguição oficiosa e de gênero, mas, eventualmente, o campo da esquerda também chafurda nesse lamaçal autoritário.

Andreza Matais, de O Estado de S. Paulo, por conta de reportagem sobre supostos deslizes no Ministério da Justiça, é vítima de reação opressiva de políticos, influenciadores digitais e governistas e acaba de adquirir o apelido de "dama das fake news".

Por essas e por outras, entidades como o Tornavoz, criadas para zelar pela liberdade de expressão, estão empenhadas na proteção legal de jornalistas reprimidas, silenciadas ou constrangidas.

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