Luiz Horta

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Luiz Horta

O pós-bacalhau

Bolovo com ovo caipira, de gema cremosa, em massa de pupunha
Bolovo com ovo caipira, de gema cremosa, em massa de pupunha - Divulgação

É minha opinião: a Tasca da Esquina empata com a Taberna da Esquina, que não fica atrás da Padaria da Esquina. Este Grupo Esquina, do Vítor Sobral, é quase um destino hipnótico para mim. Na Semana Santa, queria escapar do sazonal vinho para bacalhau. Acabei descobrindo coisas nos Esquinas.

Enquanto comia bolinhos de bacalhau (minhas convicções são frouxas), que são os melhores que conheço em São Paulo, descobri um hambúrguer de alheiras. Sobral faz a comida portuguesa mais castiça, com deslocamentos sutis nas receitas, uma abrasileirada que não é só para causar, dá outro sentido. E o hambúrguer de alheiras foi prazeroso com um tinto delicado.

Mas a surpresa foram duas sobremesas, um deles o doce mais barroco do receituário português, o pudim do abade de Priscos (leva banha de porco, vinho do Porto e uma dúzia de ovos). Não, o abade não era um homem rechonchudo e de rosto vermelho. Pela foto que ficou dele, era seco como um bacalhau, e a única receita que deixou escrita foi a do pudim. Morreu com 96 anos, o que nega que comida assim, rica, é funesta para a saúde. 

O outro doce foi o mítico pastel de feijão de Torres Vedras. Feijão! Pressinto a interrogação na cara do leitor, essas coisas com feijão em doces dão sempre errado. Pois esses pastéis folhados, de gemas (sobremesa portuguesa sem gemas acho que não existe), foram cantados até pelo poeta brasileiro Murilo Mendes (1901-1975).

No seu livro de viagens pela península, chamado "Janelas Verdes", existe uma menção à cidade de Torres Vedras, em que ele praticamente deixa a vila de lado para falar dos pastéis: "...em Torres Vedras, outra glória mais alta se alevanta: vem de seus incorporáveis pastéis de feijão, que, depois de os haver conhecido pessoalmente (...) encomendei de Roma por avião; luxo que, segundo penso, nem mesmo o Papa se concedeu até hoje".

Padaria da Esquina
onde: Alameda Campinas, 1630, Jardim Paulista, tel. 2387-0149
quando:  das 7h às 22h

 

vinhos
Divulgação / Arte: Laís Battiato

 

Rótulos de destaque
Como o assunto é português, há um grande encontro promovido pela Adega Alentejana. Provei alguns vinhos entre os apresentados e selecionei seis, de diferentes estilos e produtores. 

Uma das convidadas é Sandra Tavares, uma das maiores enólogas de Portugal. O Chocapalha Arinto é tão bom que pode ser bebido sozinho, mas não me importaria de ter bolinhos de bacalhau com ele.

O Monte dos Cabaços branco é um agradável corte de uvas alentejanas, produzido com a técnica de Susana Esteban, que dribla bem o calor da região e é delicioso com peixes. 

O Cortes de Cima tinto é mais um dos bons vinhos deste produtor que me encanta, na verdade um casal, ele dinamarquês e ela americana de São Francisco. É deles um dos meus brancos favoritos em Portugal: o Cortes de Cima branco, feito com alvarinho, viognier e sauvignon blanc. Já o tinto é um corte de syrah, touriga nacional, aragonez e petit verdot, vinho austero e elegante.

O Pó de Poeira é da quinta pessoal de Jorge Moreira, enólogo da Quinta de la Rosa. É um tinto delicado, como o Douro oferece. Da De la Rosa sugiro o tinto douROSA, que não passa por madeira e é ótimo com pratos de molho de tomate.

O Manoella tinto é do projeto de Sandra Tavares e do marido Jorge Serôdio Borges, a empresa Wine&Soul, com rótulos certamente reconhecidos: Pintas, Guru, Manoella, sempre presentes em listas de melhores vinhos portugueses.

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