Luiz Felipe Pondé

Escritor e ensaísta, autor de "Notas sobre a Esperança e o Desespero" e “A Era do Niilismo”. É doutor em filosofia pela USP.

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Luiz Felipe Pondé

Redes sociais trouxeram a estupidez popular para o seio da dinâmica política

Cada vez que se amplia a inclusão da massa na circulação de ideias, uma das consequências é a aparição de mais idiotas

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Um espectro ronda o Brasil. O espectro da estupidez. A política, a direita e a esquerda, são miseráveis.

Olhemos a política do ponto de vista da sua relação com as tecnologias de mídia. A impressão da Bíblia em língua vernácula foi uma das causas das guerras religiosas na Europa. O rádio foi essencial para os grandes movimentos fascistas no século 20. As redes sociais desempenham papel semelhante agora.

Cada vez que se amplia a inclusão da massa na circulação de ideias, uma das consequências é a entrada em cena de mais idiotas na dinâmica política.

Título: Política “for dummies"  A ilustração figurativa de Ricardo Cammarota foi executada em técnica manual com pincel em técnica nanquim aguada e acabamento em tons de cinza com traços de contorno preto.  A imagem, na horizontal, que está numa linguagem de quadrinhos, com traços simples e soltos, apresenta uma sala de sessão de terapia. A janela, emoldurada por uma cortina aberta, com vista, do alto, para a cidade cheia de prédios. Na parede, dois diplomas. O psicanalista está sentado na poltrona e o paciente deitado no divã. Ambos olhando para os seus respectivos smartphones.
Ilustração para coluna de Luiz Felipe Pondé - Ricardo Cammarota

A mídia específica "for dummies" (para bobos) são as redes sociais. A política atravessada pelas redes é a política "for dummies". Desde as convocações a golpe pelos bolsonaristas até grupos de WhatsApp em que se trocam figurinhas do Lula com coraçãozinho se trata de política "for dummies".

Há mais de dez anos o mundo festejava a ação das redes no que os inteligentinhos chamavam de "primavera árabe". Inteligentinhos com diplomas foram à região auscultar os batimentos cardíacos na nascente democracia das redes no mundo árabe. Longos artigos foram escritos explicando o efeito libertador das redes na política.

Bom, a Primavera Árabe virou guerra civil na Síria e trouxe à tona o Estado Islâmico. A juventude das redes no Egito voltou às ruas para pedir ao Exército que derrubasse o governo legitimamente eleito (!!) —a Irmandade Muçulmana—, o que conseguiram com sucesso e alívio.

A Líbia virou um acampamento dominado por tribos esquecidas, a Tunísia —berço da Primavera Árabe— vive de susto em susto. Enfim, deu ruim.

Onde estão as incríveis análises sobre as redes sociais e a democracia na Primavera Árabe? Inteligência "for dummies"? Foram esquecidas pra sorte da inteligência pública que sempre fica babando, por medo ou por tesão, quando ouve falar em "movimentos populares". O povo se movimenta como uma força enlouquecida da natureza. Nesse ponto, política e física se fazem uma só.

Em 2013, as Jornadas de Junho —a arruaça iniciada pelo movimento adolescente Passe Livre— chegaram a ser festejadas com uma mesa "urgente" na Flip para as inteligentinhas grã-finas se deliciarem com ícones ninjas da época.

Tudo era lindo nos mascarados quebrando as ruas. Mais uma enxurrada de textos eróticos sobre os movimentos populares sem liderança centralizada. Que tesão!

Pois é. As redes sociais trouxeram a estupidez popular para o seio da dinâmica política. Quando a estupidez popular combina com a minha, acho revolucionária, quando não combina, considero totalitária.

Os dois pesos e duas medidas que a inteligência pública tem aplicado aos "movimentos populares" se revelou uma faca de dois gumes.

Pois então. Os bolsonaristas golpistas acham que estão lutando pela democracia e que o Lula, junto com juízes amigos, roubou a democracia deles. Duro esse mundo pós-moderno feito de narrativas, não? Fofo ver revolucionários de bolso pedindo força policial maior, não?

A política sempre foi o território da violência, das utopias idiotas, das mentiras, da corrupção, e, com as redes sociais, dos imbecis que alçaram ao lugar de fala pleno. Melhor seria para o mundo se as redes sociais fossem simplesmente destruídas. Os imbecis voltariam à vidinha de sempre. O manto da irrelevância cobriria seu cotidiano. A democracia continuaria a usufruir da estabilidade que traz o silêncio social.

As redes sociais não fizeram as pessoas mais "informadas", fizeram as pessoas mais ignorantes da sua ignorância. Mas deliro: as redes sociais são o capitalismo hoje e, mesmo que elas destruam o mundo, continuarão de vento em popa.

As redes corroem a credibilidade institucional no mundo. Petistas deveriam agradecer a Bolsonaro. Este deu para aqueles a chance de reorganizar sua gangue com o dinheiro público. E mais: sequestrar a ideia de democracia para suas pautas.

A criação da Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia para combater a desinformação será uma
NKVD light —a Gestapo stalinista— para calar quem não lamber as botas deles. O poder adora puxa-sacos.

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