Luiz Weber

Secretário de Redação da Sucursal de Brasília, especialista em direito constitucional e mestre em ciência política.

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A hora e a vez do Supremo

Avanço de agenda conservadora é legítima e chancelada pelas urnas, mas STF terá que ser mais do que nunca contramajoritário para garantir a proteção de minorias e avanços civilizatórios obtidos

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Estatua da Justiça em frente ao Supremo Tribunal Federal, em Brasília
Estatua da Justiça em frente ao Supremo Tribunal Federal, em Brasília - Sergio Lima - 27.jul.2012 / Folhapress

O brasileiro sabe quase nada sobre o diabetes, mostrou pesquisa do Datafolha de julho deste ano. Nem desconfia se o açúcar faz bem ou mal. Ignora ainda as funções do fio dental –apenas 57% fazem uso dele. E 85% dos paulistanos desconhecem os malefícios do colesterol para o coração, ainda segundo o Datafolha. O brasileiro parece não saber de nada– exceto sobre democracia. 69% dos entrevistados afirmaram dias atrás que a democracia é a melhor forma de governo
 
No ano passado, levantamento em 38 países sobre apoio ao regime democrático, realizado pelo Pew Research Center, instituto de pesquisa de opinião pública americano, revelou comprometimento diferente. A menção ao Brasil no relatório é esta: “A média global de apoio a governos eleitos pelo povo é de 78%. Mas a intensidade desse respaldo varia significativamente entre as nações. 54% dos suecos consideraram a democracia representativa como um modelo de governo muito bom – mas apenas 8% dos brasileiros”. O brasileiro não sabe nada. Mas parece que aprende rápido conceitos complexos.
 
Pesquisas sobre o apoio de determinada população à democracia produzem resultados extraordinários. Um deles é o chamado “Paradoxo venezuelano”. O Latinobarómetro é um estudo de opinião pública, produzido por uma ONG com sede no Chile, que aplica anualmente cerca de 20 mil entrevistas em 18 países da América Latina. Faz isso há décadas. Bom, no relatório de 2017, com o presidente Nicolás Maduro barbarizando por lá, a pesquisa de opinião mostrou que 78% dos venezuelanos declararam fé na democracia. “Enquanto mundo afora líderes fustigam as medidas do governo Maduro como não democráticas e qualificam a Venezuela como uma ditadura ou um regime autoritário, os venezuelanos seguem apoiando a democracia como um tipo de regime como se nada acontecesse. O que entendem os venezuelanos por democracia? É essa a pergunta que surge dos resultados”, diz o documento. 
 
Dados estatísticos e a opinião pública são conceitos diabólicos. Nate Silver, um estatístico americano, criador do site FiveThirtyEight, famoso por suas previsões políticas (menos a eleição de Trump), autor do livro “O Sinal e o Ruído –por que tantas previsões falham e outras não”, tem uma citação de estimação: “o estatístico morreu afogado num rio de meio metro de profundidade média". O brasileiro pode morrer afogado em suas próprias opiniões. Precisamos de um salva-vidas. 
 
Opiniões variam com o tempo e as circunstâncias. É uma força indomável. Na véspera de cair sob domínio da Alemanha, a direita francesa no parlamento e nas ruas dizia: “Plutôt Hitler que Blum" (Melhor Hitler do que Blum), manifestando preferência pela canga nazista ao governo do socialista francês Léon Blum. O resto é história. 
 
Nessas horas de variação de humor do povo, de opinião pública cambiante à velocidade de um zap, as instituições devem agir. O STF (Supremo Tribunal Federal) tem uma missão. Nos últimos anos, ele se inventou, institucionalizou-se, mal ou bem pôs ordem na casa em momentos-chave, como o impeachment da ex-presidente Dilma ou a prisão de Lula e Eduardo Cunha. 
 
Com um Congresso com dois generais, dois coronéis, dois capitães, um major e uma retaguarda de sargentos e subtenentes eleitos, uma bancada ruralista e da bíblia reforçadas, é natural que a agenda conservadora avance. Os eleitos governam; deve ser assim.
 
Mas não será um período de soft power, de conversa macia em gabinetes, de mesuras a setores militares, de culto ao papel de Poder Moderador do tribunal, de algodão entre cristais. Embalado nos últimos anos pela opinião pública, o STF agradou à torcida. Agora, estará diante do maior desafio de sua história pós-88 –ser contramajoritário. 
 
É hora de chamar para a si a missão civilizadora. Que seja um “Poder Enquadrador”, mesmo desafiando a violência das redes sociais e a retórica oficial. Se preciso for, colocar de volta os radicais na casinha, suprimindo do ordenamento jurídico leis e atos do Legislativo e Executivo que tisnem direitos e valores fundamentais conquistados. Isso é Estado Constitucional de Direito. O país está sem colete salva-vidas.  

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