Adentrando a densa metrópole da capital de São Paulo, um bioma onde a natureza humana se revela em toda a sua diversidade, encontramos o habitat de uma espécie fascinante que, infelizmente, se encontra em extinção no Brasil: o homem quarentenado.
No programa de hoje, vamos descobrir como essas curiosas criaturas conseguem sobreviver a longos períodos de confinamento. Como se alimentam? Como se reproduzem? Como mantêm a sanidade mental?
Provido de um aguçado instinto de preservação, esse animal solitário segue à risca as recomendações da OMS, contrariando as leis de seu inóspito ecossistema —o epicentro de uma pandemia em processo de reabertura do comércio e de serviços não essenciais.
Todos os dias, o despertador resgata o quarentenado de seus sonhos intranquilos. Geralmente é a variação de um pesadelo comum, conhecido como “saí na rua e esqueci de vestir as calças”, adaptado ao novo normal, “saí na rua e esqueci de botar a máscara”.
Após um café da manhã indigesto, acompanhado de suplementos vitamínicos e notícias alarmantes, é chegada a hora de pegar um solzinho na janela. Aproveitando a luz, o quarentenado tira algumas selfies, mas nem os filtros mais generosos conseguem suavizar a expressão abatida de quem acompanha as lives do Atila Iamarino.
Com a autoestima lá embaixo e o tesão lá em cima, o quarentenado abre o WhatsApp e envia um emoji de foguinho para o contato Luciana Tinder, numa tentativa de convidá-la ao acasalamento.
Sua expectativa é cativar a atenção da parceira e quem sabe até receber um nude, mas a única resposta que obtém são dois tracinhos azuis e a certeza de que o sexo é um sonho tão distante quanto a vacina.
Os hábitos de higiene deste animal são bastante peculiares. Ele lava as mãos com obsessiva frequência e demonstra grande preocupação em manter seu ambiente limpo, utilizando ferramentas como o mop —um nome chique para o bom e velho esfregão— e o robô aspirador Wilson, com quem nutre uma relação similar à do personagem de Tom Hanks com a bola de vôlei no filme “Náufrago”.
No próximo bloco, vamos conhecer a fundo alguns traços comportamentais da espécie, como as crises de ansiedade pós-Jornal Nacional, as chamadas de vídeo com a câmera desativada e a sensação de ser um otário completo diante dos registros de bares lotados.
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