Manuela Cantuária

Roteirista e escritora, é criadora da série 'As Seguidoras' e trabalha com desenvolvimento de projetos audiovisuais

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Manuela Cantuária

Gado de Bolsonaro, tal qual o literal, se deixa conduzir sem hesitar

Entre tantas semelhanças, uma diferença: gado do presidente supostamente é racional

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A insônia tem os seus caprichos. Ultimamente, eu só consigo dormir assistindo a leilões de gado.

Enquanto o leiloeiro atropela as palavras, dizendo coisas como "diretamente de Mato Grosso do Sul, um touraço reprodutor, careca, couro fino, pelo curto, virilha pesada, prepúcio corrigido, carnudo, 750 quilos, quanto vale, R$ 300, eu ouvi R$ 400, quem dá mais?", sinto o abraço de Morfeu me embalar para o mundo dos sonhos.

O Canal do Boi se tornou minha pequena dose cavalar de Rivotril.

Desenho de um boi, que usa óculos escuros, camiseta do Brasil e carrega uma arma na cintura. Um balão de texto sai de sua cabeça com a palavra "mito".
Ilustração de Silvis para coluna de Manu Cantuária - Silvis

Não como carne vermelha há 17 anos. Nunca julguei o consumo de carne bovina, e sim a indústria pecuária e frigorífica. Parar de comer carne ajudou muito o meu sono, tornando minha digestão e minha consciência mais leves.

Ninguém imaginaria que, por trás dessa minha franjinha de vegana, há uma mente contraditória que agora depende de leilões de gado para me agraciar com um sono pesado como um boi nelore. Mas do que adianta, se acordo todos os dias em um pesadelo ou, em outras palavras, em um país assolado por uma onda conservadora, em que 50 milhões de pessoas querem reeleger o pior presidente da história do Brasil?

O pior é saber que, dentre esses milhões de brasileiros, existe um grupo fanático, que chama o atual presidente de mito, que ignora o fato de que Bolsonaro poderia ter evitado 400 mil mortes na pandemia; de que sua família comprou 51 imóveis com dinheiro vivo; de que a fome, o desemprego, a inflação, o desmatamento, a violência contra a mulher atingiram níveis exorbitantes em seu governo e tantos outros retrocessos.

Esse grupo fanático é conhecido popularmente por gado, porque o gado se deixa conduzir sem hesitar por um berrante, sendo um berrante um instrumento feito a partir dos chifres de um boi, com detalhes de couro. Ou seja, um instrumento de controle e persuasão que se baseia na morte, na exploração, na violência contra aquele mesmo grupo que está sendo controlado.

O som do berrante, inclusive, é marcado como uma marcha de soldado. São muitas as semelhanças entre o gado literal e o gado de Bolsonaro, mas a principal diferença entre eles é que o segundo, supostamente, é composto por animais racionais.

Talvez seja por isso que eu esteja inconscientemente buscando alguma paz interior nesses leilões de gado. Para entender como o gado de Bolsonaro pensa, ou não pensa.

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