Mara Gama

Jornalista e consultora de qualidade de texto.

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Mara Gama

Referência em agroecologia urbana de São Paulo, Horta das Corujas faz 6 anos

Comunidade cultiva verduras, temperos, ervas medicinais, frutas e plantas alimentícias não convencionais (pancs) e tem água de nascentes para as regas

Mesmo quando tem seca na cidade, não falta água na Horta das Corujas, um espaço de 800 metros quadrados que fica na Vila Beatriz, zona oeste de São Paulo.

Há 6 anos, quando um grupo de pessoas interessadas em fazer cultivo urbano resolveu sair de um papo virtual, arregaçar as mangas e criar a horta, percebeu que havia ali áreas alagadas mesmo quando o restante do terreno da praça estava seco.

Cavando essas áreas molhadas, foram identificados alguns olhos d´água e instalados sistemas simples para captação. Hoje, três cacimbas ativas servem para regar todas as plantas diariamente. Semestralmente a água é analisada pela Cetesb. A horta não precisa de água de fora. Ela é autossuficiente.

Essa é apenas uma das experiências boas que a Horta das Corujas reúne e que faz dela, em sua curta história, uma referência em atividade comunitária independente no espaço urbano.

Lá também estão instaladas algumas caixas de abelhas que foram resgatadas de alguma situação de perigo pela ONG Abelhas sem Ferrão. Essas abelhas contribuem para o sucesso do modo de cultivo agroecológico, com as plantas misturadas, o que garante equilíbrio natural e controle de pragas sem necessidade de venenos.

“Outras hortas podem até ser mais produtivas, mas não têm a mistura das contribuições das pessoas como a que temos nas Corujas”, diz Mity Hori, administradora de empresas e voluntária da horta.

Mity começou a frequentar a horta em setembro de 2014. Moradora do bairro, ficou curiosa para conhecer a experiência quando viu plantas usadas na culinária asiática num dos cantos. Fez contato com os voluntários e participou de um primeiro mutirão logo em seguida. Se surpreendeu com a quantidade de gente trabalhando “debaixo da maior chuva”. Gostou.

“Fiz meu primeiro plantio ajudada por uma voluntária mais experiente. Eu não tinha o menor traquejo de entrar numa praça pública e começar a plantar. Estava acostumada com uma ideia de jardim minimalista japonês. Ali não, é tudo misturado”, conta.

“Tem de tudo. Cada pessoa que quer plantar traz plantas que conhece e então vão se misturando as culturas das pessoas. Temos plantas que são muito usadas na Bahia, como Língua de Vaca, e ao mesmo tempo tem Nirá, que é usada na culinária japonesa”, conta.

Atualmente, ela vai duas vezes por semana para regar a horta – são dois voluntários por dia, na escala -, recebe escolas que visitam o local e uma vez por semana faz manejos de poda e plantio. “Nesses quatro anos plantei muito. Muitas vezes deu errado e, em outras, deu certo. Fui me interessando e comecei a fazer cursos sobre plantio e outras formas de ocupação do espaço urbano”, conta.

“A Horta das Corujas é emblemática. Ela está num bairro nobre, frequentada por um monte de gente de classe média, em espaço aberto, de forma colaborativa. Os aspectos social e  educacional são muito importantes para nós”, diz Mity. 

“A gente recusa investimento de fora, de empresas. Queremos que fique assim. Plantamos para todos, em local aberto. Temos oficinas de voluntários, botânicos, chefes de cozinha. Vem gente de escolas, universidades”, afirma. “Você planta e outro colhe. E quanta comida tem lá. Muitas pessoas nem enxergam, mas a gente aprende a ver.”

“Quando conheci o projeto, colei de cara. Pensei: é por aqui que a gente vai regenerar nossas cidades”, diz Andrea Pesek, arquiteta e jardineira agroecológica.

Andrea morou por muitos anos no bairro e chegou a conhecer o sítio que havia antes no local da Horta das Corujas. Viu o terreno se transformar em praça, mantendo ainda o córrego das Corujas a céu aberto. Interessada pelo mapeamento dos rios urbanos e por cultivar na cidade, se tornou frequentadora da horta em 2012.

Andrea acompanhou toda a pesquisa sobre a água e a instalação das cacimbas. “Mantemos as nascentes protegidas com vegetação e algum isolamento para que ninguém pise e aproveitamos bem essa água”, relata. “Fazemos as regas com balde, de forma bem tradicional, para manter o contato com cada planta”, conta.

A Horta das Corujas já foi objeto da tese de mestrado de Gustavo Nagib, “Agricultura urbana como ativismo na cidade de São Paulo”, e ganhou dois prêmios em 2017, o Milton Santos, pela Câmara dos Vereadores, e um dado pela ONU Habitat.

O grupo que idealizou a Horta, Hortelões Urbanos, criado em 2011 pelas jornalistas Tatiana Achcar e Claudia Visoni, segue ativo. Para organização dos mutirões e visitas, é usado um grupo no Facebook, que convida: “A Horta das Corujas está sempre aberta para voluntários e visitantes. Ela é cercada apenas para impedir a entrada de cachorros. O portão não tem tranca e pedimos que fique fechado por causa dos cães. Se você tem alguma dúvida ou quer participar, vai lá.”

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