Marcelo Leite

Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

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Guerrilha contra mudança climática ataca até Luan Santana

Grupo Brandalism ridiculariza campanha de empresa petroleira que usa celebridades pop para melhorar sua imagem perante millennials

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A luta de ONGs e jovens alarmados com a mudança do clima trazida pela queima de combustíveis fósseis, depois de invadir tribunais em vários países, chegou também ao mundinho pop. O grupo de artistas britânicos Brandalism partiu ao ataque contra a Shell, e acabou sobrando até para Luan Santana.

Quem? —perguntarão leitores da minha faixa etária e estética. Explico: o cantor sertanejo autoproclamado artista mais popular das redes sociais no Brasil. Ele participa de uma campanha de relações públicas da petroleira com o lema “Make the Future” (faça/construa o futuro), que começou em 2014.

Sorte de Luan não estar escalado para apresentar-se no festival homônimo que começa quinta-feira (5) no parque olímpico de Londres (seu nome não aparece no programa —aqui, em inglês). Brandalism e outros grupos prometem ações de sabotagem bem mais drásticas que fixar cartazes em pontos de ônibus londrinos.

O nome do coletivo de artistas é um jogo com as palavras “branding” (promoção de marca) e “vandalismo”. Os cartazes mostram gente como Luan, Jennifer Hudson, Steve Aoki, Tan WeiWei, Yemi Alade e Pixie Lott, que imagino serem celebridades nalgum continente, com olhos pintados de preto e o logo da Shell sobre a boca, a sugerir uma caveira.

O slogan “Make the Future” aparece substituído por “Save the Future” (salve o futuro). Antes do nome do artista, a frase “não caia no conto de relações públicas com popstars”.

Os artistas chamam as intervenções urbanas de “subverts”, outro trocadilho, agora com “advert” —corresponde a algo como anúncios subvertidos, ou subversivos. Seu alvo é denunciar o que consideram hipocrisia da empresa ao promover-se como apoiadora de energias limpas, que não agravam o efeito estufa.

“A cada ano, a Shell gasta milhões tentando convencer-nos de que é uma companhia ética e progressista, mas não estamos engolindo essa”, afirma Janette Watkins, 23, num comunicado do Brandalism.

“Qualquer investimento que a Shell faça em energia renovável se atrofia diante dos bilhões que eles continuam a gastar extraindo e queimando tanto petróleo quanto possível. A companhia usa popstars e campanhas publicitárias para atrair ‘millennials’ —mas nós sabemos que seu verdadeiro negócio é arrasar o clima.”

Uma acusação frequente contra a Shell é que a empresa anglo-holandesa sabia pelo menos desde 1991 dos potenciais impactos danosos do aquecimento global e nunca fez grande coisa, nesses anos todos, para combatê-los.

As intervenções do Brandalism seriam só uma curiosidade se não fizessem parte de uma mudança de comportamento e de atitude mais profunda, que afeta principalmente os nascidos pouco antes ou depois de 2000.

Muitos não querem saber de carros e nem tiram carteira de habilitação. Adoram bicicletas. Aderem ao vegetarianismo, quando não são veganos. Preferem trabalhar numa ONG ou coletivo a buscar emprego na indústria petroleira.

Se você acha que isso é coisa de uma minoria de classe média em países ricos, quando muito de seus emuladores em grandes cidades de nações de renda média como o Brasil, pense bem. Diziam-se coisas parecidas dos hippies e da contracultura dos anos 1960/70 —e veja só como eles mudaram a cara do mundo.

Outro indício do tsunami cultural a ameaçar o futuro dos combustíveis fósseis está nos processos judiciais que pipocam em vários países, assunto de que essa coluna já se ocupou, aqui e aqui.

Há também a crescente pressão pelo desinvestimento em ações de empresas dependentes deles para ter lucros, que começa a ser adotado por fundos soberanos, de pensão e de universidades. E por aí vai.

Só não vê quem não quer.

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