Marcia Castro

Professora de demografia e chefe do Departamento de Saúde Global e População da Escola de Saúde Pública de Harvard.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Marcia Castro

Que 2023 venha com saúde!

Com o novo governo eleito de forma democrática, há esperança de dias melhores

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O Brasil entra 2023 enfrentando uma crise sanitária. Há necessidade urgente de trilhar um caminho de recuperação. Com o novo governo eleito de forma democrática, há esperança de dias melhores.

A deterioração da saúde começou com a implantação da Emenda Constitucional 95, conhecida como PEC da Morte, no final de 2016. A EC 95 congelou os gastos com saúde e comprometeu a capacidade do SUS de prover serviços essenciais. A estimativa é que, entre 2018 e 2022, o SUS tenha perdido cerca de R$ 60 bilhões por causa da EC 95.

Pessoa fantasiada de Zé Gotinha aparece em pé atrás de porta de vidro recepcionando quem entra na unidade de saúde.
Zé Gotinha em campanha de vacinação infantil contra a Covid-19 no Rio de Janeiro - Tércio Teixeira/Folhapress

Os últimos quatro anos, porém, foram sem precedentes. Vivemos uma pandemia, administrada por um governo irresponsável, sem compromisso com a verdade, a ciência e a vida. O saldo disso tudo? Quase 700 mil vidas perdidas, mais de 113 mil crianças órfãs e um retrocesso de décadas em vários indicadores de saúde.

Esse governo que acaba de sair deixa um legado mórbido na saúde. Afastou a ciência da tomada de decisão, não apoiou a pesquisa básica e comprometeu a coleta de dados que são fundamentais para uma resposta rápida e eficaz às demandas sanitárias.

Cortou os canais de comunicação com a sociedade e se isolou do mundo, rompendo uma tradição de protagonismo que o Brasil costumava ocupar em acordos de cooperação internacional.

Não reconheceu o racismo estrutural como um determinante social de saúde e cortou parte do orçamento para ações de saúde indígena, a qual também foi drasticamente prejudicada por decisões que impulsionaram o desmatamento e o garimpo ilegal na Amazônia ("passar a boiada").

A lista é longa! Parte do que o SUS bravamente conquistou ao longo de três décadas foi destruída em pouco mais dois anos.

É esse cenário que terá que ser administrado pelo novo governo. Será um trabalho intenso. Realisticamente, não há como resolver tudo ao mesmo tempo e em apenas quatro anos. Afinal, também há desafios na educação, economia, meio ambiente, infraestrutura etc. Será necessário definir prioridades e promover ações intersetoriais a fim de otimizar os resultados.

O Relatório do Grupo Técnico de Saúde da Comissão de Transição Governamental, apresentado pelos ex-ministros Arthur Chioro e José Gomes Temporão à nova ministra Nísia Trindade no dia 29 de dezembro, faz uma análise do desmonte das políticas públicas de saúde, lista pontos de alerta que demandam ações urgentes, identifica atos normativos e decretos que deveriam ser revogados e recomenda dez prioridades para os primeiros cem dias de governo.

Conforme apresentado durante a coletiva, essas prioridades incluem fortalecer a gestão do SUS, reestruturar o Programa Nacional de Imunizações, fortalecer a resposta à pandemia e outras emergências, reduzir as filas do serviço especializado, fortalecer a atenção básica, resgatar o Programa Farmácia Popular, fortalecer a saúde da mulher, criança e adolescente, bem como a saúde indígena, retomar o desenvolvimento do complexo industrial da saúde e revitalizar a tecnologia de informação e saúde digital.

A ministra Nísia Trindade e sua equipe começam agora o trabalho árduo de não só definir prioridades como também elaborar o Plano Nacional de Saúde para os próximos quatro anos.

Para quem acha que os problemas podem ser resolvidos de imediato, lembre-se de que a destruição é rápida, mas a retomada é lenta. Que em 2023 haja empatia, senso comunitário e responsabilidade política e fiscal. Acima de tudo, que os direitos estabelecidos pela Constituição Federal sejam respeitados.

"A saúde é direito de todos e dever do Estado." Feliz 2023, com saúde!

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.