Na zona sul do Rio, separados por um túnel e não mais do que 500 metros de distância, há dois esqueletos culturais que assombram há quase uma década a paisagem carioca, lembrando como a inépcia do poder público pode ser nociva.
O mais célebre deles é o Canecão, em Botafogo, onde se apresentaram todos os artistas fundamentais da MPB (“Nesta casa se escreve a história da música popular brasileira”, dizia seu célebre letreiro na entrada) e não poucos estrangeiros. Inaugurado em 1967, está fechado desde 2010, quando a UFRJ venceu uma briga judicial para retomar o terreno que era seu.
Retomou e não fez nada além de anunciar vários planos para o lugar desde então. O mais recente deles é o lançamento, em junho, de um edital público para licitar o uso do imóvel. Não se sabe qual será o modelo proposto ou o prazo para reativação da casa. Enquanto a licitação não sai, a reitoria tenta regularizar a situação do lugar —o Canecão operava como casa de shows sem permissão legal.
Andando de lá rumo a Copacabana, cruza-se com os escombros do imenso teatro Villa-Lobos, pertencente ao estado do Rio. Fechado para reformas desde 2010, pegou fogo no fim do ano seguinte, quando já haviam sido gastos R$ 2 milhões em obras.
O incêndio veio a calhar para a gestão obreira de Sérgio Cabral, que reformulou os planos para o local, ampliando o tamanho da reforma e seu custo — inicialmente, R$ 36,7 milhões; depois, R$ 50 milhões. Pós-Lava Jato, o orçamento caiu para R$ 20 milhões, já no fim do ano passado. Nada foi feito até agora e não há a menor perspectiva de que seja.
O exemplo oposto veio da iniciativa privada que, após 18 anos, reabriu (no último dia 4) o antigo teatro Manchete, agora Adolpho Bloch —o empresário que, curiosamente, foi um dos idealizadores do Villa-Lobos. O palco recuperado, na Glória, permite uma ponta de esperança neste momento tão sinistro da cultura carioca.
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