Em artigo publicado nesta Folha, na quinta-feira (13), argumentei que furar o teto de gastos para aumentar investimentos em infraestrutura não é uma boa ideia.
É questionável o argumento de que investimentos públicos são gastos temporários, que podem ser acionados rapidamente para estimular a economia e tirá-la da recessão e que ainda deixariam como legado uma melhor infraestrutura, capaz de acelerar o crescimento futuro.
Argumentei que o investimento público não serve como remédio imediato para estimular a economia, pois da decisão de investir até o começo do dispêndio podem se passar anos.
Quanto ao impacto no crescimento de longo prazo, a experiência recente do PAC é que produzimos infraestrutura ruim e obras inacabadas. Muitas são sucatas, que nada produzem.
Vale olhar o que a literatura econômica diz a respeito.
Artigo recente de Valerie Ramey apresenta um modelo keynesiano típico, em que há muito espaço para que o gasto público estimule o crescimento do PIB: o chamado “efeito multiplicador”.
A autora mostra que, quando se introduz uma defasagem nos investimentos públicos —a demora entre a decisão de investir e o gasto efetivo—, o multiplicador de curto prazo desse investimento vai para zero. Não há estímulo à economia.
Ou seja, se o objetivo é recuperar a economia a curto prazo, o investimento público não é o melhor instrumento.
As defasagens entre a decisão de investir e a realização do investimento usadas por Ramey são pequenas em relação ao crônico atraso das obras brasileiras. Ela trabalha com projetos “prontos para executar”, no contexto dos EUA: 60% do gasto em um ano, tudo pronto em quatro anos.
Por que se imagina que alguns bilhões em investimento público vão mudar a trajetória da economia a curto prazo, quando o governo federal já está gastando mais de R$ 500 bilhões com medidas de mitigação da Covid? Boa parte disso com transferência de renda para pessoas de baixa renda, com alta propensão a consumir.
Se esse estímulo fiscal não animar o PIB a curto prazo, não é o investimento público que o fará.
Em um modelo para o Brasil que considera o efeito da defasagem dos investimentos, Julio Mereb e Eduardo Zilberman estimaram, em 2013, que os investimentos do PAC produziram uma queda do PIB entre 0,2% e 0,4% em um horizonte de quatro anos. Tudo indica que nosso multiplicador do investimento público, a curto prazo, é negativo!
Quanto ao efeito de longo prazo, Ramey aponta três fatores relevantes. Primeiro, o estoque atual de infraestrutura. Em países carentes desses ativos, como o Brasil, adicionar mais capital público impulsiona o crescimento.
Porém, outros dois elementos jogam contra.
Primeiro, se o investimento for de baixa qualidade, não ajuda o crescimento.
Segundo, há a forma como os investimentos serão pagos. Aumento de impostos, em um sistema tributário tão distorcivo quanto o nosso, afeta negativamente as decisões de investir e consumir e derruba o crescimento.
Se optarmos por pagar o investimento aumentando a dívida, os juros vão subir, pois nossa dívida pública já é muito alta, e o risco de default aumentará. Juros mais altos também são ruins para o crescimento.
Antes de gastar mais, precisamos de reformas que permitam gastar melhor.
A pressão por investimentos parece mais ligada a interesses eleitorais e a manter a fidelidade dos militares, com a compra de equipamentos bélicos.
E há os interesses privados submersos, como um projeto de lei votado no Senado nesta semana, que direciona recursos do pré-sal para subsidiar empresas de gasoduto e que faz uma doação federal à Cemig. Dinheiro público em favor de interesses particulares.
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