Marcos Augusto Gonçalves

Editor da Ilustríssima, formado em administração de empresas com mestrado em comunicação pela UFRJ. Foi editor de Opinião da Folha

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O dinizismo e a onda do "Brasil voltou" de chuteiras

A estreia de Fernando Diniz anima quem sonha com o reencontro do futebol brasileiro com sua essência

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Depois da exaustão do período de Tite na seleção, que colheu resultados muito ruins em duas Copas, eis que a estreia de Fernando Diniz no comando técnico, com uma goleada sobre a Bolívia, já começa a liberar fantasias recalcadas sobre um possível reencontro do futebol brasileiro com o que seria sua essência –ou com suas melhores características históricas. Estaríamos começando a ver uma espécie de "o Brasil voltou", expressão usada pelo presidente Lula em fóruns internacionais, de chuteiras.

O arranjo passadista, de um treinador que acumula clube e escrete, e o jeitão de gambiarra da coisa toda, com a promessa duvidosa da vinda de Carlo Ancelotti para a reta final, não deixam de nos remeter à surrada ideia de um Brasil em que o improviso e a criatividade driblam a rigidez metódica e o planejamento para triunfar sobre as adversidades –muitas delas fruto da própria bagunça estrutural.

Neymar comemora com o técnico Fernando Diniz após marcar gol na vitória de 5 a 1 do Brasil contra a Bolívia, em Belém, nas eliminatórias da Copa de 2026 - Carl de Souza -8.set.23/AFP

Não é bem disso, porém, que se trata. Diniz, em que pese a aparência meio boleira, que destoa do engomadinho Tite e dos engravatados técnicos europeus, não é nenhum peladeiro. Se não tem um vasto currículo de títulos a ampará-lo, tem sem nenhuma dúvida uma concepção tática definida, com boa dose de originalidade, e também um método de treinamento. A ponto de se ter cunhado a expressão dinizismo para definir seu estilo de jogo.

É de se registrar que o dinizismo apresenta-se rapidamente nas equipes comandadas pelo treinador e tem demonstrado capacidade evolutiva –vem ganhando consistência e competitividade ao longo do tempo.

A ressalva, contudo, não impede que se evoque a contraposição entre o padrão adotado por Tite, um tanto tecnocrático, empolado e "europeu", e a concepção de Diniz. No jargão futebolístico, o treinador do Fluminense seria mais associativo e funcional, ao passo que Tite tenderia a um jogo mais posicional, com jogadores "presos" em posições.

As duas maneiras de jogar são igualmente meritórias. Ocorre que a tradição brasileira, como muitos defendem, seria tolhida pela tática posicional naquilo que tem de melhor ou de distintivo –a qualidade técnica e a criatividade e o improviso dos jogadores, que existem mesmo e sempre encantaram plateias.

Há muito de esquematismo nesse debate, que precisaria levar em conta também a oferta de supercraques como tivemos em outros tempos. Mas diria que com Tite o esquema tático de fato contrariou algumas características do futebol brasileiro (mobilidade e laterais apoiando, por exemplo), o que até poderia não ser um problema, não fosse a cintura dura do treinador, com seus compromissos de fidelidades, sua precária leitura de jogo e a tendência a confiar mais na "ciência" do que na "arte".

Diniz fez apenas uma partida contra uma seleção que já apresentou dificuldades aqui e ali, mas é um consagrado saco de pancadas quando atua fora da altitude de La Paz. Com poucos dias para treinar, já implantou seu jogo de posse de bola e associações (isso está de certa forma no DNA brasileiro) e suas inversões de lado.

Não deixou também de usar alguma coisa da tática posicional —dando provas de que na realidade não se trata apenas de uma polarização entre uma ou outra maneira de jogar, mas da predominância de uma sobre a outra sem negacionismos principistas.

Nesta terça (12/9) o dinizismo de camisa amarela volta ao campo, fora de casa, contra o Peru, adversário mais forte, mas em fase negativa. Diniz tem a seu dispor, pela primeira vez na vida, um elenco de jogadores habilidosos capazes de executar sua utopia futebolística. Mas será preciso esperar, como dizem os britânicos, pela prova do pudim, que virá diante de seleções fortes e tradicionais.

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