Marcus André Melo

Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).

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Marcus André Melo
Descrição de chapéu Eleições 2018

Governabilidade dependerá de como Jair Bolsonaro enxergará sua vitória

As instituições não funcionam em um vazio normativo

Há duas visões rivais sobre um futuro governo Bolsonaro. A primeira está assentada em um argumento institucionalista forte, Linziano, de crise em regimes presidencialistas.   

A expressão remete a Juan Linz (1926-2013), para quem este tipo de regime é constitutivamente instável devido a sua inflexibilidade (o presidente tem mandato mesmo quando perde apoio parlamentar) e sua legitimidade dual (presidente e Congresso são eleitos).

O futuro governo representaria nesta visão um “homem forte” que teria fortes incentivos para implementar unilateralmente sua agenda. 

Defrontando-se com um Congresso hostil, tentará de forma plebiscitária aprovar sua agenda, deflagrando uma crise constitucional. Sua falta de compromisso com a institucionalidade democrática converteria seu governo numa bomba-relógio.

A segunda visão poderia ser chamada de institucionalista fraca, pós-Linziana, do presidencialismo. Nela a relação Executivo-Legislativo não é um jogo de soma zero: há incentivos sob o presidencialismo para a cooperação porque há ganhos de troca.

Não há necessariamente duas agendas: presidencial e legislativa. Nesta visão o presidente terá incentivos para moderar suas propostas e se engajar em barganhas congressuais, com governadores etc.  Mas há uma variável de escolha crítica para o presidente: o estilo de gerenciamento da sua coalizão parlamentar e societal.  

Muita coisa dependerá de como o presidente enxerga sua vitória: o núcleo duro do seu eleitores corresponde a algo como um terço do total, os demais dois terços que o apoiaram o fizeram por rejeição ao seu rival.

A governabilidade dependerá em larga medida desse apoio crítico —“pivotal”— e suas expressões congressuais. Porque as instituições não funcionam em um vazio normativo.  Só governos totalitários independem da opinião pública.

O novo presidente governará sob forte constrangimentos: o STF em particular atuará como robusto ator de veto, sobretudo no campo de suas iniciativas comportamentais e institucionais. Assistiremos a sua transformação de “golpista togado” em “garantidor da democracia”: atuará não só unanimemente, mas com apoio social avassalador.

Durante a crise do governo Café Filho, o ministro do STF Nelson Hungria criticou os que pareciam “supor que o Supremo Tribunal, ao invés de um arsenal de livros de direito, dispõe de um arsenal de shrapnel [obuses] e de torpedos”.

Deparando-se com uma “insurreição”, tudo que a corte poderia fazer, assegurava, era inocuamente “expedir mandado para cessá-la”. Na realidade, com apoio massivo da opinião pública, pode muito mais do que isso, como a experiência recente demonstra.

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