Maria Hermínia Tavares

Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.

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Maria Hermínia Tavares
Descrição de chapéu Folhajus

No STF, um ministro terrivelmente amigo

Com sua escolha, Lula provocou indignação dentro e fora do PT

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Ao indicar para uma vaga do STF (Supremo Tribunal Federal) seu advogado amigo, o presidente Lula criou indignação dentro e fora do PT. Afinal, logo que vestiu a toga, deu cinco votos que o opuseram à maioria da Corte e o alinharam aos ministros patrocinados por Bolsonaro.

Mas, para além do conhecido pragmatismo do cliente, sua escolha leva à cena uma questão maior, que há décadas desafia os progressistas: como acomodar, na agenda classista e redistributiva, a questão ambiental e as demandas por direitos de grupos que não se imaginam parte dessa ou daquela maioria.

O fenômeno tem milhagem. Já em 1977, o cientista político americano Ronald Inglehart (1934-2021) publicou "A Revolução Silenciosa", no qual anunciava significativo câmbio na cultura política dos países desenvolvidos, associado à chegada do que então se passou a designar sociedade pós-industrial.

O conflito político —organizado em termos de crescimento econômico, redistribuição de seus frutos e o papel do Estado nisso tudo— ganhava outras clivagens, advindas dos temas trazidos pelas gerações mais jovens. Assim, Inglehart anunciou a ascensão de uma agenda que chamou de pós-materialista. O conceito incluía muitas coisas díspares: defesa do meio ambiente, direitos das mulheres e outros grupos de gênero (na sociedade e nas famílias), antirracismo, pluralismo cultural e religioso, tolerância com o uso de drogas.

O ministro do STF Cristiano Zanin no julgamento do marco temporal - Adriano Machado/Reuters

Na visão do autor, a nova cultura política progressista se somaria àquela que tradicionalmente identificava as esquerdas social-democratas e as opunha às forças conservadoras. Faltou combinar com os fatos. Salvo raríssimas exceções, o diálogo entre as duas formas de progressismo —o redistributivo e o ecológico-identitário— foi e continua a ser difícil em toda parte, Brasil incluído.

Aqui é enorme a resistência daquela parcela da sociedade, muito mais conservadora do que bem-informada, a bandeiras que lhes pareçam distantes de suas carências cotidianas, como a da proteção ambiental; que sejam do interesse de minorias, como a defesa dos povos indígenas; ou que preguem o reconhecimento de direitos tido como ameaça a seus valores e crenças morais. Por essa razão, quem dependa de votações majoritárias para fazer carreira política trata de dar as costas a isso tudo.

Assim, a efetividade daqueles direitos abrigados na Carta de 1988 —e imprescindíveis para civilizar o país— só pode vir do poder contramajoritário da Suprema Corte.

Daí que a escolha de seus membros poderá ter terríveis consequências se a amizade e o pragmatismo míope prevalecerem.

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