Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Mariliz Pereira Jorge
Descrição de chapéu Todas Enem

Violência doméstica é nossa culpa

Lamento ter largado a mão daquela amiga no passado

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

No começo da vida adulta, uma amiga me procurou porque tinha sido agredida pelo namorado. Parti para cima dele quando o encontrei, mas pouco depois eles estavam novamente juntos. Quando soube que as agressões continuavam, me afastei. Confesso que, afundada nos preconceitos sobre o assunto na época, entendi que ela "gostava".

O pensamento dominante ainda projeta a mulher como seu próprio algoz, como se dependessem apenas dela as atitudes para que o ciclo da violência na qual está inserida seja quebrado. Ou seja, é estuprada porque usa saia curta, é espancada porque gosta. Não denuncia porque é fraca, covarde, porque se beneficia. Se é pobre, é ignorante. Se é rica, é acomodada.

Não bastam apenas leis que enquadrem os crimes contra a mulher, é preciso que reconheçamos como sociedade nossa responsabilidade ao perpetuar padrões que normalizam abusos físicos, psicológicos e financeiros. É urgente identificar as falhas de um sistema que ainda não proporciona todas as ferramentas para que vítimas consigam se libertar de relações violentas. É fundamental que todos sejamos agentes dessa transformação.

Inúmeros fatores mantêm a vítima desse machismo institucional refém de relações abusivas. A violência contra mulher não tem CEP, escolaridade ou conta bancária. Ela está presente nas vielas das favelas e nas coberturas de frente para o mar. Atinge mulheres como Ana Hickmann e Rihanna, e de forma ainda mais devastadora entre pobres e da periferia. É uma conta que soma dependência emocional e/ou financeira. O status social, alimentado na sociedade, que não tem nada a ver com dinheiro, mas com a posição dentro de um grupo que as mulheres separadas ainda deixam de ter. Pode parecer paradoxal, mas o medo de mais agressões e, pior, da morte muitas vezes impede que a mulher peça ajuda ou que vá embora. E vergonha. A vergonha de se admitir e de se expor como vítima.

Precisamos estar atentos aos sinais, à luz vermelha que sempre começa a piscar e indica relações recheadas de abusos psicológicos que sempre precedem a violência física. Perguntar, ouvir, acolher, dar informações, não desqualificar o parceiro, respeitar o ritmo da vítima, ter paciência, não abandonar. O mais importante, jamais julgar. Lembre-se, abuso físico e psicológico não é exclusividade de casais heterossexuais. Lésbicas e gays engrossam a estatística e muitas vezes têm ainda mais dificuldade de encontrar acolhimento.

Lamento ter largado a mão daquela amiga no passado, o que jamais faria novamente com qualquer outra pessoa que precise de ajuda para se salvar.

Como parte da iniciativa Todas, a Folha presenteia mulheres com dois meses de assinatura digital grátis

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.