Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Não diga 'eu te amo', diga 'por favor'

Ao contrário do que possa parecer, manter no vocabulário amoroso palavras que soam como meras formalidades dá tesão

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Quando me perguntam o que um casamento precisa para dar certo, tenho dificuldade em determinar o que fez diferença nos quase 12 anos que dura o meu. Soubesse a resposta, teria escrito livros, dado palestras e estaria agora pelada numa rede em algum lugar do Pacífico, tomando uma cerveja local.

Arrisco dizer que talvez tenha sido dizer mais "obrigada", "por favor", "com licença", "me desculpe" do que "eu te amo". E não economizo nas declarações, que acontecem quando estamos remelentos do sono, entre uma reunião aqui e uma outra live ali, quando ele me pergunta se quero algo do supermercado e sempre antes de dormir. Sempre talvez seja um pouco demais.

Noiva e noivo dão as mãos
Noivos em casamento - Jeremy Wong Weddings/Unsplash

Já disse hoje que te amo? Muitas vezes. Reafirmar que ele é minha pessoa preferida no mundo, e vice-versa, é um jeito de nos lembrar como é gostoso gostar um do outro. Um exercício diário ao qual me dedico com prazer e que inclui a cortesia que acaba abandonada à medida que a intimidade aumenta.

"Ninguém vai te tratar tão bem quanto o homem que quer te comer." A frase é de uma participante do BBB e resume bem a decadência no trato que corrói os relacionamentos depois que o sexo perde o estímulo inicial. Assim como nenhuma mulher vai ser tão charmosa e carinhosa quanto aquela que quer te comer. Adeus, "por favor". Alô, barbárie.

Uma conhecida, tão doce de pessoa que chega a ser enjoativa, trata o marido como um menino de oito anos que precisa levar bronca para se comportar como a vida adulta espera de um marmanjo. Ele não tem iniciativa, ela já perdeu a paciência, o que é compreensível. Não há resquícios de gentileza entre os dois. Ela dá ordens, ele obedece, ela vibra no mau humor, ele vive amedrontado. Mas ainda dizem "eu te amo".

Outro casal que encontro de vez em quando é ainda mais constrangedor. Numa tarde na praia, os dois chegaram com o filho. Ela passou o dia correndo atrás da criança e se certificando de que o baldinho de cerveja dele estava abastecido. Não ouvi um único "por favor" ou "obrigado", mas "mozão" estava a postos, apesar de parecer a ponto de pedir demissão do casamento.

Não me pareceu um desses acordos que estão voltando à moda entre membros da família tradicional brasileira, que exaltam o papel das "tradwives" (esposas tradicionais). O fato é que ela obedece, ele paga a conta e não diz nem "obrigado". Mas "eu te amo" ainda rola com um beijinho na testa.

Não sei o que desaparece primeiro, o amor, a paciência, o respeito. Sem eles, casais se atropelam e passam apenas a aturar a convivência com o outro. Tratam aquele que dizem amar com menos cuidado do que fariam com qualquer outra pessoa. Ao contrário do que possa parecer, manter no vocabulário amoroso palavras que soam como meras formalidades destinadas a desconhecidos dá tesão.

Intimidade é respeitar espaços, e não falo sobre bater na porta quando ela está fechada, ainda que isso seja importante. É entender o outro como indivíduo e não como nossa própria extensão, a qual tratamos sem qualquer cerimônia.

Significa que não tem desentendimento e treta? Claro que tem. Mas fica muito mais fácil atravessar o lamaçal com a bandeira da paz, pedir e aceitar desculpas, se usamos essa palavrinha mágica no dia a dia por coisas desimportantes.

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