Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu seis Olimpíadas, Copa e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Marina Izidro
Descrição de chapéu atletismo

Tênis com placa de carbono é doping tecnológico?

Eu vou usar, sem culpa, um supertênis na Maratona de Londres

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Dia desses eu estava no ônibus, aqui em Londres, indo participar de uma meia maratona. Um homem entrou e eu não consegui parar de olhar para o tênis que ele usava: amarelo fluorescente, enorme, sola grossa, parecendo uma lancha. Ele era alto e magro e, fosse um tempo atrás, poderia ser confundido com um corredor profissional. Mas ele era mais um amador, que nem eu, no transporte público a caminho da prova.

Ele estava com o Nike Alphafly 3, que aqui custa £ 284,99 (R$ 1.800). Esse é um dos chamados "supertênis", que não são mais restritos a corredores de elite e se tornaram febre. Em linhas gerais, têm uma placa de fibra de carbono na entressola que ajuda a poupar energia, auxilia na propulsão e, portanto, na performance. Feitos principalmente para provas, dão a sensação de estar com molas debaixo dos pés.

Alphafly 3, tênis com placa de carbono da Nike
Alphafly 3, tênis com placa de carbono da Nike - nike.com

Todos os campeões de maratonas usam um supertênis. O queniano Eliud Kipchoge teve pares personalizados para ele em 2017, na primeira tentativa de correr a distância de uma maratona em menos de 2h, e em 2019, quando conseguiu o feito.

O queniano Eliud Kipchoge ao vencer a Maratona de Berlim em 2023 - Tobias Schwarz/AFP

Com outras marcas rapidamente desenvolvendo seus modelos, a World Athletics, federação internacional de atletismo, interveio. Em 2020, estabeleceu regras para competições profissionais: sola com no máximo 40 mm de espessura e apenas uma placa e proibição do uso de protótipos. O tênis de Kipchoge de 2019 hoje é banido para a elite.

Metaspeed Sky+, modelo de tênis com placa de carbono da Asics
Metaspeed Sky+, modelo de tênis com placa de carbono da Asics - asics.com.br

Na prova olímpica em Paris-2024, os atletas no pódio certamente estarão com o último modelo de seus patrocinadores. Só que, na maratona, existe uma marca mágica a ser batida: qual ser humano vai correr abaixo de 2h em uma prova oficial (a de Kipchoge não conta porque foi um projeto feito para a quebra do recorde)?

Fuelcell Supercomp Elite V4, tênis com placa de carbono da New Balance
Fuelcell Supercomp Elite V4, tênis com placa de carbono da New Balance - newbalance.com.br

Os supertênis impulsionam o debate entre quem acha que eles vão banalizar recordes mundiais e quem defenda que ajudam a deixar a modalidade mais atraente. Li uma entrevista recente da britânica Paula Radcliffe, ex-recordista mundial da maratona, dizendo que se orgulha de sua marca ter sido alcançada com um tênis das antigas.

A britânica Paula Radcliffe ao vencer a Maratona Feminina de Nova York em 2008 - Shannon Stapleton/Reuters

Outros esportes lidam com dilemas parecidos. Quem se lembra dos maiôs tecnológicos nos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008, quando atletas vestindo o LZR Racer da Speedo ganharam 98% das medalhas na natação? Modelos feitos de poliuretano, que ajudavam na flutuação e repeliam água, acabaram banidos pela Federação Internacional de Natação.

A nadadora norte-americana Missy Franklin com o modelo LZR Racer X, da Speedo, em 2015 - Mike Segar/Reuters

No esporte profissional, o debate é fundamental e é preciso ter estudos científicos e regulamentações.

No caso de nós, mortais, amadores, não vejo motivo nem para ter implicância com os tênis de placa nem para achar que são a salvação. Muita gente prefere os modelos "tradicionais" ou não quer investir tão alto em um calçado que terá poucos usos, e tudo bem.

Adeziro Adios Pro3, tênis com placa de carbono da Adidas
Adizero Adios Pro3, tênis com placa de carbono da Adidas - adidas.com.br

No próximo domingo (21), vou correr a Maratona de Londres com um supertênis. Testei nos treinos e achei confortável. Muitos participantes farão o mesmo —seja para tentar recordes pessoais ou para completar a tarefa hercúlea de percorrer os 42km195m com menos dores no corpo.

Eles são um doping tecnológico? Na minha opinião, não, porque há regras. Se alguém discorda delas é outra história. Não há como fugir da tecnologia.

Corre Supra, tênis com placa de carbono da Olympikus
Corre Supra, tênis com placa de carbono da Olympikus - olympikus.com.br

Por fim, de nada adianta um bom tênis se você não fizer a sua parte. Ele pode ajudar, mas você ainda precisa correr toda a distância, e isso não vai acontecer sem muita dedicação e treinamento.

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