Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Descrição de chapéu América Latina

Se chegar ao 2º turno no Chile, Kast terá de enfrentar uma democracia vibrante

Política do país está perturbada por processo de renovação, mas é cheia de intensidade e participação

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A campanha chilena teve até cenas de realismo mágico. Em pleno debate, José Antonio Kast, o expoente da 
extrema direita, começou a agitar a bandeira de Cuba, aludindo à ameaça de uma ditadura castrista no país, 
perante os olhos incrédulos dos outros presidenciáveis.

A sua quase garantida passagem para o segundo turno na eleição deste domingo (21) torna o paralelo entre a situação chilena e brasileira inevitável. Lá e cá, um extremista chega às portas do poder agitando fantasmas antiesquerda e marchando sobre as ruínas do sistema político. Mas a realidade é mais complexa.

O candidato à Presidência do Chile José Antonio Kast chega a local de votação, em Santiago
O candidato à Presidência do Chile José Antonio Kast chega a local de votação, em Santiago - Ernesto Benavides/AFP

Como explicou ao colunista o professor Simon Escoffier, da Universidade Católica do Chile, as eleições deste ano são o pico de um processo de transformação iniciado em 2011.

Ficarão gravadas na história a reforma do sistema eleitoral de 2015, o lançamento de uma Assembleia Constituinte com o apoio de 80% da população e o ocaso político de lideranças tutelares como a ex-presidente Michelle Bachelet e o atual, Sebastián Piñera.

Do alto dos seus 35 anos, Gabriel Boric se apresenta como o herdeiro dessa revolução.

A sua coalizão representa a geração de líderes estudantis que construíram um projeto de reforma do Estado em cima dos protestos contra o sistema educacional. Para vencer resistências, Boric se cercou de um grupo de economistas que defendem a fogo e ferro o pragmatismo do seu programa, tipicamente da centro-esquerda europeia, nos principais jornais do país. 


É legítimo questionar se a jovem coalizão de Boric vai resistir ao teste de poder. Mas ela é infinitamente mais 
promissora do que a amostra de projeto esquerdista 
que hoje governa o Peru.

José Antonio Kast é, dentro da extrema direita, diferente de Bolsonaro. Ele se apresentou durante toda a campanha eleitoral como o razoável entre os radicais. Só que a moderação termina na primeira página do seu programa.

Entre outros pontos sórdidos, ele defende a criação de uma coalizão de polícias da América Latina para 
perseguir militantes da esquerda. Kast, no entanto, beneficiou-se de dinâmicas conjunturais, como a chegada em massa de migrantes venezuelanos, injustamente acusados de contribuírem para 
o aumento da violência urbana e de roubarem os empregos dos chilenos durante a pandemia de coronavírus.

Mas o Chile de 2021 nada tem a ver com o Brasil de 2018. Os cativantes debates presidenciais mudaram o destino da eleição. Toda a oposição teve amplas oportunidades para expor os disparates do candidato Kast e pedir satisfação, ao vivo na televisão, do seu programa. Os militares chilenos, repudiados 
depois de algumas declarações polêmicas no ano passado, mantiveram-se em silêncio durante a campanha.

Pressionado pela sociedade, Kast começou a cometer erros. Sua defesa do ditador Augusto Pinochet numa entrevista a jornais internacionais pode ter lhe custado a liderança no primeiro turno. Bolsonaro foi eleito numa democracia anestesiada, sitiada por militares e assediadores virtuais.

Se chegar ao segundo turno, Kast terá de enfrentar uma democracia perturbada pelo processo de renovação, mas cheia de intensidade e participação.

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