Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Fake news podem ser corrigidas em tempo real com inteligência artificial

Mentiras ditas por Bolsonaro no JN e em debates, ouvidas por milhões de pessoas, ainda não são reparadas a tempo

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A televisão ao vivo é o grande hospedeiro do parasito da desinformação. Já sabíamos disso há alguns anos, mas a recente entrevista de Bolsonaro ao Jornal Nacional e o debate com candidatos à Presidência na Band deixaram claro que é preciso sair da constatação e partir para a ação.

"O senhor tem xingado ministros do Supremo Tribunal Federal", disse William Bonner. "Você não está falando a verdade quando fala em xingar ministro. Isso não existe. É uma fake news da sua parte", respondeu o presidente. "Em nome da verdade, o senhor xingou ministro do Supremo de canalha", replicou o apresentador.

Presidente Jair Bolsonaro em entrevista ao Jornal Nacional - Reprodução/TV Globo

A correção foi importante, mas incompleta. Além de chamar Alexandre de Moraes de "canalha" em um discurso em São Paulo, Bolsonaro também xingou o ministro Luís Roberto Barroso de "filho da puta" em conversa com apoiadores em Santa Catarina.

Na sequência, Renata Vasconcellos entabulou um diálogo tenso sobre a atuação do presidente na pandemia de coronavírus. A agência Aos Fatos, acompanhando o pingue-pongue, apontou seis afirmações falsas e uma imprecisa de Bolsonaro durante a conversa. Apenas em São Paulo, 6,6 milhões de pessoas assistiram à entrevista. Dessas, quantas tiveram acesso ao balanço da agência de checagem?

"Sobre o seu comportamento com as frases que eu mencionei, imitando pacientes com falta de ar, muitos viram isso como um sinal de falta de compaixão", disse Renata. "Eu queria que você botasse no ar, eu imitando falta de ar", disse o presidente. Por que o JN não atendeu o pedido? O vídeo existe.

O UOL Confere apontou mentiras, distorções, erros e imprecisões em oito afirmações de Bolsonaro durante o debate. O ótimo texto foi publicado cerca de dez horas após o encerramento do evento na Band, que foi assistido por 2,8 milhões de pessoas em São Paulo. Quantas leram o balanço das mentiras?

A pronta correção feita por Bonner no caso do xingamento de Bolsonaro a ministros do STF indica um caminho: checagem em tempo real na televisão. "Para quem luta contra a desinformação, um avanço notável frente ao que se viu em 2018", registrou Cristina Tardáguila, fundadora da Agência Lupa. "Naquele ano, a bancada do JN ficou de mãos atadas frente a temas absurdos como o ‘kit gay’."

A mentira atinge imediatamente o espectador, enquanto o checador precisa de algum tempo para encontrar os dados que a refutem. É uma luta desigual. Por esse motivo, já há alguns anos, empresas vêm desenvolvendo softwares para combater fake news em tempo real.

A britânica Full Fact trabalha com três ferramentas baseadas em inteligência artificial. Um software de transcrição automática das falas alerta sempre que é feita uma afirmação "sensível", que merece ser checada. A dificuldade é ensinar a máquina a selecionar apenas temas relevantes.

Outro software cruza falas ditas ao vivo com verificações de fatos já feitas anteriormente, alertando sobre mentiras. Uma terceira ferramenta facilita o cruzamento de declarações baseadas em estatísticas com um banco de dados contendo estatísticas oficiais.

A inteligência artificial não vai substituir os checadores, ao menos no curto prazo. Mas tem ajudado muito, disse Tardáguila. "A inteligência artificial vem muito a calhar em período eleitoral. Ela diminui o tempo entre a mentira e a verdade."

Empresas de comunicação deveriam se aparelhar melhor para enfrentar esse desafio e só aceitar promover debates ou entrevistas com políticos se eles concordarem que suas afirmações sejam submetidas a correções em tempo real.

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