Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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'The Morning Show' explica o porquê das séries de TV piorarem com o tempo

Como tantas outras, seriado da Apple TV+ enfrenta o problema comum de conquistar o público e não ter mais o que dizer

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Chegando atrasada no mercado de streaming, a Apple recorreu a um armamento pesado para promover o lançamento de sua plataforma, em novembro de 2019: a série "The Morning Show". Em dez episódios, o programa provocou impacto ao expor, em chave realista, os bastidores de um canal de notícias americano abalado pela revelação de que um importante apresentador era também um predador sexual.

Inspirado no livro de um jornalista sobre a guerra entre os programas matinais da TV americana, "The Morning Show" apresentou um painel impiedoso dos "novos tempos" de busca pela audiência. Com produtores guiados pela ideia de que o espectador estaria interessado em notícias mais leves e de caráter humano, a série ajuda a entender por que o bom jornalismo muitas vezes foi deixado em segundo plano.

Cena de 'The Morning Show'
Cena de 'The Morning Show', com Jennifer Aniston e Reese Whiterspoon - Divulgação

Com Jennifer Aniston, Reese Witherspoon e Steve Carell, a primeira temporada conseguiu falar do tema certo na hora certa —uma qualidade raras vezes alcançada pela ficção seriada.

Dois anos depois, ainda tratando das consequências do escândalo sexual revelado na primeira temporada, "The Morning Show" voltou ampliando o cardápio de temas "quentes". A segunda temporada discutiu também racismo, homofobia, assédio moral e outros problemas estruturais que podem aflorar numa redação, além de retratar de passagem o impacto causado pela pandemia de coronavírus.

Por tudo isso, causa espanto os rumos tomados por "The Morning Show" na terceira temporada, em exibição desde a segunda quinzena de setembro. A série está irreconhecível. Até o mais desavisado espectador deve ter notado que os roteiristas decidiram transformar a história num grande novelão.

Alerta: não pretendo revelar nenhum detalhe fundamental, mas os leitores mais sensíveis devem evitar os próximos parágrafos, que contêm spoilers.

Ainda ambientada nos tempos atuais, a série agora foca mais sobre a crise financeira da rede UBA. Em busca de um investidor que compre o canal, o CEO Cory Ellison, vivido por Billy Crudup, negocia com um bilionário da indústria de tecnologia, vagamente inspirado em Elon Musk.

Paul Marks, interpretado por Jon Hamm como um sujeito aparentemente bobão, está promovendo uma viagem espacial privada e planeja contar com a presença da apresentadora Alex Levy (Aniston) no voo.

Para complicar as coisas, hackers invadem os sistemas do canal de notícias e capturam e-mails e vídeos que expõem todos os funcionários. Cory aproveita a crise interna para resolver suas diferenças com a principal acionista da UBA –uma disputa encenada em reuniões com cara de novela de Walcyr Carrasco.

Depois de ver os primeiros seis episódios da terceira temporada, um deles extremamente cansativo, dedicado a mostrar o que aconteceu com os personagens em 2020, cheguei a me perguntar se a série sempre foi ruim e eu não tinha notado. Acho que não.

Com uma quarta temporada já encomendada, "The Morning Show" enfrenta um problema muito comum: não tem mais o que dizer. Conquistou público, até mesmo um fã-clube, mas precisa apelar a situações sem pé nem cabeça, tediosas, repetitivas ou grotescamente dramáticas, para manter o espectador sintonizado.

Como muitas outras, "The Morning Show" é uma série que piorou à medida que conquistou mais espectadores. Como o momento não é propício para discussões acaloradas, não vou dar nomes aqui. Deixo para o leitor refletir e, se quiser, mencionar as séries que, na sua opinião, se enquadram nesta mesma situação.

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