Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Projeto de novo canal vem recheado de boas intenções

Executivo promete ajudar a despolarizar o país, mas não diz como fazer isso

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Num mercado aparentemente saturado de canais de notícias, o empresário Douglas Tavolaro anunciou na semana passada o lançamento de uma versão brasileira do norte-americano CNBC, especializado em jornalismo econômico e de negócios.

É a segunda franquia que Tavolaro traz ao país. Em 2020, ele costurou o lançamento da CNN Brasil, mas foi forçado a deixar o comando do canal um ano depois, por iniciativa do seu principal sócio, o empresário Rubens Menin.

Antes disso, por mais de uma década, Tavolaro foi responsável pela direção do jornalismo da Record TV, de propriedade do bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal.

Douglas Tavolaro no estúdio da CNN Brasil - Divulgação

Em entrevista à Folha nesta semana, o executivo deu a entender que o canal não se limitará ao jornalismo de negócios: "Existe minha vontade de ter uma grade diversificada, com formatos diferenciados. Dentro do hard news, que tenha política, internacional, esportes, as notícias urgentes de última hora", disse.

Em outras palavras, a CNBC pretende se aventurar por áreas onde já existe fartíssima oferta de noticiário, produzido por GloboNews, CNN Brasil, BandNews, RecordNews e Jovem Pan.

O que mais me surpreendeu nos planos de Tavolaro sobre o futuro canal foi a sua declaração de intenções: "Eu quero ajudar a despolarizar o Brasil, vamos fazer um jornalismo que sempre fiz, que é imparcial e apartidário. Eu quero ajudar a sair dessa polarização que existe no noticiário".

Que polarização é essa? O fato de os profissionais do jornalismo se situarem, majoritariamente, entre o centro e a esquerda no campo político não me parece ser um grande problema, como alguns enxergam. Porque quem dita a regra do jogo, nas grandes empresas, é o dono.

Os proprietários das grandes empresas de TV sempre tiveram preferência por governos que pendem do centro para a direita e têm rejeição a governos de esquerda, apenas com variações de tonalidade na adesão ou na repulsa.

Esse predomínio ideológico eventualmente se reflete no noticiário, na decisão de enfatizar exageradamente alguns assuntos e na minimização de outros. Mas seria injusto ignorar os muitos exemplos de bom jornalismo praticado pelos canais de TV ao longo do tempo, a despeito da visão política dos donos.

Talvez Tavolaro esteja se referindo a uma novidade que ocorreu, de fato, durante o governo Bolsonaro (2019-2022). Ela diz respeito à clara distinção que se estabeleceu entre os canais que abraçaram com entusiasmo o governo de extrema direita, com vocação antidemocrática, e os canais que enxergaram os riscos envolvidos nessa escolha. Mas isso não é polarização.

Como escrevi há um mês, ainda resta apurar se houve, e qual foi, a contribuição de alguns desses meios de comunicação de massa aos planos golpistas do governo derrotado nas eleições de 2022.

Superado o risco do golpe, me parece que houve um realinhamento natural a um estado anterior, que já vimos antes. Por exemplo, a escolha de deputados radicais para presidir comissões importantes na Câmara dos Deputados é vista pela mídia como derrota do governo, o que de fato é, mas não como um atraso para o país, o que também é.

Num momento de crise no negócio da comunicação, com enxugamento de custos, demissões e revisões de investimentos, é boa notícia, naturalmente, ouvir sobre os planos de criação de um novo canal de notícias.

Enxergar que o país está polarizado politicamente não exige muito esforço. Mais difícil é trabalhar contra a intolerância e em favor de pautas que busquem atrair o interesse de diferentes públicos.

A intenção de Tavolaro é boa, mas não basta dar entrevistas. Quando criou a CNN Brasil, ele também prometeu que o canal não seria "nem de esquerda, nem de direita". Foi apenas um bom slogan.

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