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Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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'Por que me cobram a maternidade?', indaga Paolla Oliveira

Atriz fala sobre novo longa com Lázaro Ramos, relembra quando precisou improvisar no Carnaval e admite que nunca se preocupou tanto com o voto como agora

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A atriz Paolla Oliveira, no Rio de Janeiro Fe Pinheiro/Divulgação

Nem mesmo Paolla Oliveira fugiu à cartilha que transforma mulheres e maternidade em termos indissociáveis. A seu respeito, já ouviu que era menos feminina, desprovida de afeto e até mesmo que não representava a família —o que quer que isso significasse ao seu interlocutor— por não incluir o plano de ter filhos entre as suas prioridades.

"Um bom movimento para reagir a uma crítica é você se procurar. E eu achei tudo isso uma balela", diz a atriz à coluna.

Aos 40 anos, ela lança mão da mesma firmeza para expressar suas posições e refutar outros estereótipos. Um deles é o de sex symbol. "Não estou me permitindo mais me colocar nesse lugar", afirma Paolla.

Cinco anos atrás, ao conceder uma entrevista para esta coluna, a atriz causou furor nas redes sociais por hesitar e declarar que preferia o termo "igualdade" à palavra "feminista". "De lá para cá, eu consigo entender: não somos iguais", declara hoje sobre seu posicionamento mais assertivo.

Na próxima quinta-feira (11), a atriz chegará às salas de cinema com "Papai É Pop", filme de Caíto Ortiz em que contracena com Lázaro Ramos. "Vi gente chorando, vi mãe saindo, vi pai meio de lado, envergonhado", diz ela sobre sua experiência com as pré-estreias do longa.

Em conversa por vídeo com a coluna desde o estúdio A da TV Globo, onde grava a novela das sete "Cara e Coragem", Paolla Oliveira fala sobre o novo trabalho no cinema, relembra quando precisou improvisar com uma caneta para desfilar no Carnaval deste ano, afirma que é preciso se posicionar politicamente e admite que nunca se preocupou tanto com o voto quanto nestas eleições. "A política tomou um outro rumo."

O DESPERTAR

As artes nunca fizeram parte da minha vida, mas me salvaram. Não sabia que ia virar atriz, muito menos que ia ter sucesso, que seria reconhecida.

Meu pai [o policial aposentado José Everardo] é um cara humilde que veio do Nordeste e teve uma criação super rígida. A minha mãe [a ex-auxiliar ​ de enfermagem Daniele] trabalhou em dois empregos, criando três filhos dentro desse relacionamento com responsabilidades não equilibradas, cheia de culpa. Eu cresci aí. Cresci sem ouvir música, cresci sem... Não que eu não tivesse acesso a livros, meu pai sempre cobrou isso. Mas a livros como entretenimento, não. Tudo eu fui buscar.

Pedi um dia para o meu pai me levar para conseguir a senha de um curso público, de artes cênicas, que era de graça, no [bairro do] Tatuapé, lá na zona leste [de São Paulo], chamado Raul Seixas. Ele não entendeu nada [risos].

A primeira vez que entrei numa sala em que eles falavam palavras como "criatividade" e "imaginação" teve um poder de tirar coisas que estavam em mim, nessa alma que estava ali se debatendo dentro dos quadrados da vida, de coisas muito bem estabelecidas. Só dei vazão a quem é a Paolla depois que conheci aquela sala de aula.

PRESSÃO

Já ouvi coisas do tipo "você é menos feminina porque não fala da maternidade como se espera", "você é menos amorosa ou afetuosa", "você não representa a família". Isso já me deixou bastante chateada.

Acho que um bom movimento para reagir a uma crítica é você se procurar. E eu achei tudo isso uma balela, a ponto de não me tocar mais.

A atriz Paolla Oliveira, no Rio de Janeiro - Fe Pinheiro/Divulgação

Tenho uma família gigante que carrego comigo o tempo inteiro e faz parte de quem eu sou. Ser afetuosa, amorosa e generosa não tem nada a ver com isso. Mais uma vez colocam a maternidade como uma coisa para a qual a gente nasceu e tem que executar em algum momento. Está errado isso.

Dessa vez [com o filme "Papai É Pop"], a gente puxou uma responsabilidade que é muito importante [a paterna]. A gente fala em milhões de crianças que nascem sem o nome do pai no registro. Por que me cobram a maternidade? A maternidade está acontecendo no Brasil todo dia, de várias maneiras diferentes, com todas as dificuldades.

PAPAI É POP

A gente criou um certo preconceito em relação a filmes blockbusters: ou a gente está num movimento muito "cool" [descolado, em tradução livre] de filmes mais densos, e a gente faz isso muito bem, ou então a gente está na comédia. Essa vertente do cinema [blockbuster] me agrada muito, que é de a gente falar de coisas que são importantes e levantar debates, mas de uma maneira leve e familiar.

O filme fala da construção de um pai e da desconstrução dessa mãe que a gente já conhece. Tudo faz parte ainda de uma realidade que a gente tem que desconstruir —ou construir. A mãe "ter nascido" para ser mãe, cuidadora e detentora de todos os poderes familiares ainda faz muito parte [da realidade das pessoas]. O quanto as mulheres ainda são privadas, e isso é histórico, depois que elas são mães!

Vi gente chorando no cinema, vi mãe saindo, vi pai meio de lado, envergonhado.

ELA DISSE, ELE DISSE

Eu ando devolvendo algumas perguntas. As pessoas têm me perguntado muito sobre ter feito 40 anos, e a primeira coisa que eu falo é: ganhei liberdade.

Por que você não pergunta isso para um homem? Por que você não faz perguntas sobre look, sobre pressão estética? Por que não pergunta da barriga de um colega seu? [risos]

As pessoas acham que não tenho esse tipo de pressão. "Ah, Paolla, a sex symbol". Não fui eu que me coloquei nesse lugar. Tenho questões e pressões em relação a mim como qualquer outra mulher. E não estou me permitindo mais me colocar nesse lugar.

FEMINISTA, SIM

Me coloco, sim, nessa posição com mais firmeza porque consegui ver que o feminismo vai muito além do que a palavra se propõe. Ou pelo menos do que algumas pessoas acham, né? Já fazia parte de mim sem eu nem saber como funcionava.

Foi em 2017 [quando concedeu a entrevista para a coluna]? Quantos anos tem aí?

Diante da reparação histórica, o mínimo que a gente pode esperar é a igualdade. De lá para cá, eu consegui entender: não somos iguais, não seremos nunca.

Talvez [o feminismo] esteja mesmo mais agressivo, mais impaciente, mais apressado, e tudo bem. É como quando a gente fala um pouco sobre a questão do racismo. As pessoas têm pressa, estão cansadas.

A atriz Paolla Oliveira, no Rio de Janeiro - Fe Pinheiro/Divulgação

ELEIÇÕES EM 2022

Vivemos um momento em que, calando, a gente está errado. Calado a gente está se posicionando. A política tomou um outro rumo.

A gente está falando neste momento sobre democracia ou não democracia, o Estado democrático, a gente está falando de algo muito maior. Não precisa ser muito ávido por política para entender.

Talvez a gente não estivesse precisando conversar sobre esse assunto se outras coisas tão sem propósito não tivessem sido faladas. É muito triste ter que fazer uma carta aberta [referindo-se ao manifesto que defende a democracia e que será lançado em 11 de agosto] falando sobre um posicionamento que a gente já conhece ou deveria conhecer.

Nunca me preocupei tanto com a questão do votar. Estou com medo de sair no dia da eleição mesmo. Acho que, infelizmente, vão ser dias um pouco complicados e agressivos, então estou me organizando para poder votar um pouco mais perto de casa e poder me recolher, não estar sujeita a nenhum perigo.

NA TELINHA

A gente fala: "Ah, novela das nove grava mais". Mas não. Estou [trabalhando] todos os dias, de segunda a sábado, o dia inteiro. Às vezes, faço coisa de 30 cenas. Mas é isso, estou acostumada já. Eu gosto.

Já tenho um combinado, todo mundo sabe. O Diogo [Nogueira, cantor e seu namorado] ontem me perguntou: "A gente vai conseguir ir no casamento de fulano?". Eu falei: "Só sei uma semana antes". E é verdade. Saiu o meu roteiro, eu programo a minha vida.

O CARNAVAL EM ABRIL

Foi tudo muito. Foi o Carnaval da libertação, de uma alegria reprimida, de a gente poder estar ali, com saúde, com vacina e com esse tema [que homenageou a divindade Exu].

A cereja do bolo foi ter ganhado o primeiro título para uma escola que não é só uma escola, é uma comunidade. As pessoas trabalham, têm família e estão ali porque elas querem. Acho que tem muito valor o que a gente faz de coração.

A atriz Paolla Oliveira, no Rio de Janeiro - Fe Pinheiro/Divulgação

Sempre entrei com uma pequena dor na avenida. Um pouco antes de começar, estava passando mal porque estava doendo muito uma amarração que eu tinha feito [no adereço que usou na cabeça]. Resultado: desfilei pela avenida inteira com uma caneta enfiada aqui [diz, rindo, enquanto aponta para a cabeça]. Me aliviou, porque tinha alguma coisa pressionando. Coisas que acontecem só no Carnaval. "Eu vou entrar e vai ser lindo" [pensou]. Pô, não deu outra.

As pessoas falam sempre "quer aparecer bonita com pouca roupa". Eu quero aparecer bonita. Ponto final. A gente quer aparecer com o melhor que a gente tem. Não importa se é gordo, se é magro, se é baixo. Não importa. É a Paolla escolhendo estar ali. Quem quiser, gosta. Quem não quiser, não gosta.

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