Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa
Descrição de chapéu pt stf operação lava jato

Sem Lula, em vez de disputa entre medo e esperança, teremos embate entre medo e terror

Na ausência da centro-esquerda, a centro-direita tende a disputar contra o terror da extrema direita

Os marqueteiros dizem que eleições são geralmente disputas entre medo e esperança. Entre o desejo de manter tudo como está, com receio de que as coisas piorem, e a vontade de mudar tudo, com a expectativa de que a situação melhore.

Essa lógica se aplica bem ao Brasil dos últimos anos. Em 1994 e 2002, a esperança venceu o medo. Primeiro pela perspectiva de controle da inflação (o Plano Real de Fernando Henrique), depois pela perspectiva de redução de desigualdades (o Brasil de Todos de Lula). Nos dois casos, a esperança se mostrou correta por motivos diferentes.

Já em 1998 e 2014, o medo venceu a esperança. No primeiro caso, pelo receio de depreciação cambial e retorno da inflação. Isso garantiu a reeleição de FHC. No segundo momento, havia o temor de perda das conquistas sociais dos anos anteriores. Isso garantiu a reeleição de Dilma.

 Nos dois casos parte do que se temia acabou acontecendo por uma razão comum: a inviabilidade das propostas econômicas apresentadas na campanha.

Antes de prosseguir, informo aos desavisados de sempre que não estava no governo nem participei da campanha de 2014. De volta ao principal.

As eleições de 2006 e 2010, por sua vez, foram pontos fora da curva. O cenário externo favorável e o sucesso do governo Lula em combinar crescimento econômico com redução de desigualdades transformaram a votação daqueles anos em uma celebração ufanista do Brasil.

Como tudo tem um preço, a inflexão da política econômica do governo Lula em 2006-10 deu tão certo que gerou excessos nas ações do governo, sobretudo a partir de 2012.

Houve projetos superdimensionados, adiamento de reformas necessárias e intervenção excessiva em alguns mercados em 2012-14. Tudo isso em um cenário externo e interno não tão favoráveis como antes.
Neste ano a situação é diferente de todas eleições passadas. Temos um pessimismo tão grande com a política que o medo resolveu prender a esperança com receio de perder as eleições.

Se a prisão e o impedimento de que Lula participe das eleições se mantiverem até outubro, tudo indica que, em vez de uma nova disputa entre medo e esperança, teremos um embate suicida entre medo e terror.

Hoje a centro-direita voltou ao discurso do medo, agora contra espantalhos de corrupção e intervencionismo, apostando no desenvolvimento por geração espontânea e manutenção de desigualdades.

O problema é que, na ausência de um candidato de centro-esquerda, a centro-direita tende a disputar contra o terror da extrema direita. Contra a ideia de que o Brasil só “dá certo” com restrição de liberdades individuais, aumento de desigualdades e violência contra os mais pobres.

Existe alternativa na centro-esquerda. Na combinação de responsabilidade fiscal e social, no combate à corrupção sem viés político e, mais importante, na continuidade da inclusão social além das transferências de renda.

As soluções não são fáceis e demandam diálogo. Hoje mais do que nunca, precisamos de bons mediadores políticos, mas nosso melhor mediador foi preso e empurrado para a extrema esquerda na última semana, após uma sequência de decisões jurídicas questionáveis.

A luta pela libertação de Lula continua nos tribunais e, para interromper a marcha da insensatez, o medo deveria concluir que é preciso libertar a esperança para lutar contra o terror.
 

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