Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa

O V imperfeito do PIB

Para recuperar o nível pré-pandemia, será preciso errar para mais em medidas de reconstrução

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Saiu a primeira estimativa oficial do PIB no terceiro trimestre de 2020. Digo estimativa, pois o número provavelmente será revisado, como tem sido praxe nos últimos anos.

Para dar um exemplo, o IBGE inicialmente estimou que o PIB tivesse crescido 1,1% em 2018. Passados dois anos e com informações mais detalhadas, o IBGE revisou o crescimento de 2018 para 1,8%, o que gerou autocongratulação por parte de alguns ex-membros do governo Temer, esquecendo que eles mesmos haviam prometido expansão de 3% ou mais para aquele ano... mas estou divagando.

A primeira estimativa do IBGE para o PIB é geralmente conservadora. O número definitivo só sai depois de dois anos, ou seja, conheceremos melhor o PIB de 2020 no fim de 2022. Isso também acontece em outros países, mas um pouco de apoio (orçamento) ao IBGE diminuiria o tempo de revisão... estou novamente divagando. Aos números!

Há duas maneiras de ler o PIB. A primeira é calcular o crescimento em relação ao período imediatamente anterior. Como a atividade econômica tem flutuações periódicas (devido ao clima, número de feriados e outros fatores), é preciso fazer ajuste sazonal nesse tipo de cálculo.

No terceiro trimestre de 2020, o PIB com ajuste sazonal teve crescimento de 7,7% em relação ao período anterior. A recuperação parece forte, mas, dado que houve queda de 9,6% do mesmo indicador no segundo trimestre, a recuperação foi incompleta, um “V” imperfeito, como vem acontecendo em vários países do mundo.

A outra forma de ler o resultado é comparar PIB do terceiro trimestre de 2020 com o terceiro trimestre de 2019. Nesse caso houve queda, de 3,9%, a terceira redução consecutiva por esse critério, pois a economia brasileira já estava fraca antes da pandemia, e a Covid-19 derrubou o nível de atividade a partir de março.

Seja qual for a métrica escolhida, o choque da pandemia só não foi maior porque o governo, empurrado pelo Congresso, adotou medidas fortemente expansionistas contra a crise. A principal foi o auxílio emergencial, com previsão de injeção de R$ 374 bilhões na renda das famílias ao longo deste ano. Em segundo lugar veio a ajuda temporária a estados e municípios, que deve atingir R$ 79 bilhões em 2020.

Diante de tamanho estímulo fiscal, alguns especialistas em prever o passado já decretaram que o Brasil gastou demais contra a Covid-19. Trata-se daquele tipo de pessoa que, da segurança de seu escritório na Faria Lima, pontifica o que fazer com a renda dos mais pobres, mas pouco fala da renda dos mais ricos.

O estímulo fiscal foi excessivo? Talvez sim, mas, durante o auge da crise, vários economistas (de Prêmios Nobel ao FMI, incluindo a heterodoxia nacional) recomendaram arriscar errar para mais em vez de para menos.

Por que seria menos grave errar para mais? Porque isso salvaria mais vidas e empregos e, passada a tempestade, seria menos difícil corrigir um excesso do que uma insuficiência de estímulo fiscal.

Agora a discussão passa para 2021 e, mesmo com expectativa de crescimento de 3,5% no próximo ano (média das expectativas mais recentes do mercado), não voltaremos rapidamente ao nível de renda pré pandemia.

Com base nos resultados do terceiro trimestre, espera-se queda de 4,5% do PIB em 2020, e, portanto, será necessário crescimento de 4,7% em 2021 para voltarmos ao nível de renda de 2019. É possível? Sim, mas isso requer mudança de estratégia fiscal, novamente arriscando errar para mais em medidas de reconstrução econômica, como se discute no resto do mundo e até no FMI, mas ainda não em Brasília

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