Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Nelson Barbosa

Bipolaridade fiscal em Brasília

Austericídio volta em 2023 após PEC do desespero eleitoral

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Devido à regra fiscal estapafúrdia inscrita pelos temerários temeristas na Constituição, nesta semana o Congresso aprovou mais uma PEC (proposta de emenda à Constituição) sobre assuntos orçamentários e, ao mesmo tempo, previu o retorno ao austericídio em 2023.

Do lado expansionista, a PEC do desespero eleitoral autorizou gasto adicional de R$ 41 bilhões, na véspera da eleição. Somando a desoneração de tributos federais sobre combustíveis e os cortes de IPI e imposto de importação feitos há alguns meses, o pacote eleitoral de Bolsonaro já soma 1% do PIB em um ano.

Bolsonaro promulga PEC eleitoral, ao lado de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco
Bolsonaro promulga PEC eleitoral, ao lado de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco - Gabriela Biló/Folhapress


Parte do atual impulso fiscal eleitoral se justifica, pois é necessário reforçar as transferências de renda aos mais pobres e amenizar o choque dos preços dos combustíveis. Outra parte, o "bolsa-caminhoneiro" e o "bolsa-taxista", é puro gasto eleitoral populista. O principal problema da PEC do desespero eleitoral é institucional, pois ela criou grande incerteza econômica sobre 2023, com elevação imediata da taxa de câmbio e do juro real.

Do lado contracionista, nesta semana o Congresso também aprovou a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2023, com meta de déficit primário de R$ 66 bilhões (0,6% do PIB) e retorno ao teto de gasto primário. Dentre as medidas contracionistas esperadas para 2023, estão o fim do adicional de R$ 200 no Auxílio Brasil e o retorno do PIS-Cofins sobre combustível.

Caso confirmadas, as duas ações gerarão uma contração fiscal de 1% do PIB, ou seja, o governo Bolsonaro já anunciou que, a partir de janeiro, retirará todo o estímulo eleitoral concedido agora.

No universo alternativo da LDO 2023, também haverá crescimento de 2,5% do PIB no próximo ano. Torço para que seja isso mesmo, mas acho que não acontecerá do jeito previsto pelo Congresso por três motivos: o aperto monetário do BC, a desaceleração mundial em curso e a perspectiva de ajuste fiscal contida na própria LDO. Em oposição ao cenário róseo de Brasília, o mercado espera crescimento entre zero e 1% em 2023.

Para que o leitor tenha ideia da distância entre o real e o imaginário, o pacote eleitoral de Bolsonaro deve elevar a projeção de déficit primário federal de 0,7% para 1,6% do PIB neste ano. Do outro lado, como a LDO 2023 projeta um déficit primário de 0,6% do PIB no ano que vem, haverá contração fiscal de um ponto percentual do PIB em 2023. Alguma coisa vai ceder no atual cenário fiscal, e todo o mundo sabe o que é mais provável.

O novo governo, que espero não ser Bolsonaro, pedirá novo espaço fiscal adicional em 2023, mudando o teto de gasto e a meta de resultado primário. Quanto? Para resolver as barbeiragens bolsonaristas sem parada súbita da economia, o gasto primário de 2023 provavelmente voltará ao nível praticado por Temer em 2016, cerca de 20% do PIB.

Adicionando as receitas, o resultado primário deve ser um déficit de 2% do PIB, bem acima do projetado na LDO 2023.

Antes que o leitor se apavore, lembro que a inevitável expansão fiscal de 2023 pode ser construtiva, se ela vier atrelada a reformas de longo prazo que garantam o reequilíbrio do Orçamento e a queda do endividamento público mais à frente. Foi isso que Fernando Henrique fez ao estourar a dívida pública e depois propor responsabilidade fiscal para seus sucessores. Foi isso que Temer tentou fazer ao expandir o gasto e depois criar um teto, também para seus sucessores.

Agora, a diferença é que o presidente eleito neste ano terá que propor algo com efeito significativo já durante seu próprio mandato, exatamente como Lula fez, em 2002-03.

Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.