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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Blindada de multas há 18 anos, Gontijo agora cobra R$ 31,7 milhões da ANTT

Empresa de ônibus interestadual quer que agência pague por autos aplicados desde 2006; ANTT diz que cumpre decisão judicial

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Brasília e São Paulo

Uma das maiores empresas de ônibus do Brasil, a Gontijo está há 18 anos blindada pela Justiça de pagar multas por descumprimento de regras do serviço interestadual de transportes.

Graças a uma decisão de 2006, a companhia não só evitou o desembolso de R$ 7,1 milhões por infrações a ela atribuídas como agora cobra R$ 31,7 milhões da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e da PRF (Polícia Rodoviária Federal) por 1.424 sanções aplicadas desde então.

Movimentação no terminal rodoviário Barra Funda, zona oeste de São Paulo
Movimentação no terminal rodoviário da Barra Funda, zona oeste de São Paulo - Jardiel Carvalho - 30.out.22/Folhapress

Essa situação começou em janeiro de 2006, quando a PRF (Polícia Rodoviária Federal) apreendeu cinco coletivos da viação por transportar passageiros sem permissão da ANTT.

A Gontijo, então, foi à Justiça e pediu não só a liberação dos veículos como a anulação, por inteiro, da norma da agência que regulamenta a aplicação de penalidades no transporte interestadual (resolução 233/2003).

A empresa alegou que a agência, por meio da resolução, criou penalidades que deveriam ser estabelecidas por meio de lei –a lei que instituiu a ANTT, de 2001, prevê a atividade de fiscalização do órgão, mas não descreve as sanções.

Em maio daquele mesmo ano, o juiz Evaldo de Oliveira Fernandes Filho, da 14ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte (MG), concedeu uma liminar afastando a aplicação da resolução para a Gontijo.

Nela, determinou que os ônibus fossem liberados e proibiu, sob pena de multa de R$ 10 mil, que a empresa fosse punida pelo motivo que havia embasado as apreensões —usar um só ônibus para fazer duas ou mais linhas dentro de uma rota interestadual.

Entre outros argumentos, o magistrado afirmou que, conforme princípio constitucional, "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".

A medida foi ratificada em duas decisões posteriores do juiz, em setembro de 2006 e agosto de 2007, após a Gontijo alegar que continuava sendo multada pela agência.

"Em bom e claro português, a ré [ANTT],seja por seus próprios servidores/fiscais, seja por agentes da PRF ou de outros órgãos conveniados, federais, estaduais ou municipais, não pode autuar a autora [Gontijo] por suposta infração às regras constantes da malsinada Resolução n° 233-ANTT", escreveu.

O juiz manteve a multa de R$ 10 mil por auto de infração aplicado à Gontijo.

A agência recorreu, mas não obteve sucesso no TRF-1 (Tribunal Regional Federal da Primeira Região), que, em 2015, deu razão à empresa.

A ordem judicial se aplica à Gontijo e não às suas concorrentes.

Agência multada

O processo transitou em julgado e a ANTT informou que 927 multas à empresa, listadas na sentença de 2007, estariam sendo canceladas. No entanto, no ano passado, a Gontijo afirmou na Justiça que não só aquelas, mas todas as penalidades já emitidas com base na resolução deveriam ser anuladas e que, para cada uma, fosse aplicada a multa prevista nas decisões judiciais.

No total, entre 2006 e 2016, foram lavrados 1.424 autos "em desrespeito à decisão judicial", segundo a empresa, que agora cobra R$ 31.793.747, valor obtido a partir do cálculo de R$10 mil para cada um, com a correção monetária.

A companhia juntou ao processo uma lista que detalha as penalidades aplicadas, com data, local, código de infração, entre outros dados.

Em março deste ano, a Justiça intimou a ANTT e a União, que representa a PRF, a se manifestarem sobre o pedido da Gontijo para cumprir a sentença e cobrar os valores.

Caso não haja impugnação parcial ou total dos cálculos por nenhuma das partes, a cobrança segue seu curso.

O diretor-geral da PRF, Antônio Fernando Souza Oliveira, pediu à ANTT, no último dia 8, que informe se 256 multas aplicadas por seus policiais à transportadora mineira (do total de 1.424) se enquadram na resolução.

O motivo é que os autos ficam registrados num sistema ao qual só a agência tem acesso atualmente.

Fundada em 1943, com sede em Belo Horizonte, a Gontijo integra o chamado G-7, grupo das sete viações mais poderosas do Brasil, que dominam o transporte interestadual.

Atualmente, tem mais de 1.500 veículos e transporta cerca de cinco milhões de passageiros anualmente por 18 estados.

Consultada, a Gontijo disse que o caso está sub judice e, por isso, não fez comentários.

Decisão judicial é cumprida, diz ANTT

Por meio de sua assessoria, a ANTT rebateu a Gontijo e informou que, desde a decisão judicial, não aplicou nenhuma multa contra a empresa com base na resolução contestada.

"A decisão refere-se à imposição de sanções administrativas à autora [Gontijo], incluindo advertências, multas, apreensões/retenções de veículos, e impedimentos de seguir viagem devido ao transporte de passageiros entre seções de uma rota autorizada ou permitida pelo poder público ou baseando-se em quaisquer infrações previstas na resolução 233/2003", disse a agência em nota.

A ANTT afirma que, no "âmbito do serviço de transporte interestadual de passageiros", há outras resoluções, que preveem penalidades que a agência não está impedida de aplicar. "A ANTT está cumprindo a decisão judicial".

Com Diego Felix

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