Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Paul Krugman

O que sabemos sobre as posições econômicas do Partido Republicano

Demanda por política fiscal dura era só desejo de sabotar Barack Obama

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Você se lembra da grande onda de medo da inflação em 2010-2011? A economia dos Estados Unidos continuava profundamente deprimida, por efeito do estouro da bolha da habitação e da crise financeira de 2008. O desemprego continuava acima dos 9%; o crescimento dos salários tinha se desacelerado severamente; e os indicadores de inflação subjacente estavam bem abaixo das metas do Fed (Federal Reserve), o banco central dos Estados Unidos.

Por isso, o Fed estava fazendo o que podia para estimular a economia -mantendo as taxas de juros de curto prazo mais baixas que podia, e adquirindo títulos de longo prazo na esperança de obter tração adicional.

O republicano Mike Pence, atual vice-presidente dos Estados Unidos - Chip Somodevilla - 6.mai.19/Getty Images/AFP

Mas os republicanos estavam em armas, e alertavam que as políticas do Fed gerariam inflação descontrolada. Um deputado federal chamado Mike Pence apresentou um projeto de lei que proibiria o Fed de levar em conta o estado do mercado de trabalho, ao decidir sobre suas ações. Um verdadeiro quem é quem dos republicanos assinou uma carta aberta a Ben Bernanke, então chairman do Fed, exigindo que ele abandonasse seus esforços monetários, que segundo os signatários geravam risco de "degradação da moeda e inflação".

E republicanos supostamente respeitáveis propagavam teorias de conspiração, dando a entender que o Fed estava secretamente mancomunado com o governo Obama. Paul Ryan e o economista John Taylor declararam que a política do Fed "parece claramente ser uma tentativa de resgatar nossa política fiscal, e esforços como esse colocam em questão a independência do Fed".

É claro que todos esses alertas estavam completamente errados. A inflação jamais decolou. Quase nenhuma das pessoas que promoveram histeria inflacionária admitiu que estava errada. Bernanke, os economistas do Fed e os keynesianos em geral estavam certos: imprimir dinheiro não é inflacionário em uma economia deprimida.

Mas o que havia por trás desses alertas sombrios sobre a inflação? Bem, eles surgiram no mesmo momento em que os republicanos estavam alertando sobre as horríveis, terríveis e inaceitáveis consequências de operar com o orçamento em déficit.

Era evidente já naquele momento que a pose dos republicanos quanto ao déficit era pura hipocrisia -evidente, ao menos, para todas as pessoas exceto a elite de Washington. Bastava estudar o que continham as propostas orçamentárias de Ryan para compreender que ele não estava sendo sincero, e que usava o déficit como desculpa para atacar programas sociais e agrilhoar Obama. Era completamente previsível que os republicanos viessem a decidir que o déficit não tinha importância assim que retomassem a Casa Branca.

Mas imaginei que as coisas fossem um pouco diferentes com relação à política monetária. Os republicanos vêm sendo o partido da irresponsabilidade fiscal desde a era Reagan, e não havia motivo para acreditar que mudariam. Mas a defesa do padrão ouro, o ódio à moeda fiduciária e o horror a imprimir dinheiro pareciam ser atitudes duradouras por parte da direita. Imaginei que Ryan, que certa vez afirmou ter aprendido tudo que precisava saber sobre política monetária lendo "A Revolta de Atlas", de Ayn Rand, talvez acreditasse naquilo que dizia sobre o Fed.

À luz dos recentes acontecimentos, porém, parece que eu estava errado. A pose republicana quanto à política monetária era tão insincera quanto sua pose sobre a política fiscal. Agora temos de ver as demandas por uma política monetária firme que o partido fez em 2010-2011, bem como suas demandas por uma política fiscal dura, como reflexo não de princípios econômicos, mas do desejo de sabotar Barack Obama.

O fato é que a tentativa de Donald Trump de colocar Stephen Moore no conselho do Fed fracassou pelo motivo errado. Moore terminou rejeitado por ser um indivíduo desprezível. Mas deveria ter sido rejeitado de primeira por conta de suas opiniões sobre a economia. Ele não só esteve errado, vezes sem conta, durante a crise financeira e nos anos que se seguiram; ele não só se recusou a admitir seus erros, ou a aprender qualquer coisa com eles; como inverteu completamente sua posição assim que Trump assumiu a presidência, o que faz dele um animal político e nada mais. Moore exigia taxas de juros mais altas quando o desemprego estava em 9%; agora, quer taxas mais baixas quando o desemprego está abaixo de 4%.

Mas, como eu disse, não é por isso que Moore fracassou - já que todo o seu partido seguiu o mesmo caminho. Mike Pence, que exigia juros mais altos na economia profundamente deprimida de 2010, quer juros baixos agora. Nenhum republicano do Congresso parece ter criticado Moore por suas opiniões políticas; as críticas se limitaram à sua misoginia. Excetuado Greg Mankiw, de Harvard, nenhum economista republicano importante se opôs à indicação de Moore, ainda que ele estivesse claramente promovendo hoje a politização da política monetária que Taylor e Ryan disseram ter detectado em 2010.

É fato que os republicanos estão hoje advogando políticas a que se opunham quando elas eram muito necessárias. Como aponta Matt O'Brien, não se vê a mesma cois do lado democrata. Os economistas de centro-esquerda que argumentam há anos que o Fed é conservador demais continuam a dizer a mesma coisa com Trump na presidência.

O que tudo isso nos diz é que o posicionamento dos republicanos sobre política econômica é sempre assumido de má fé. Eles não acreditavam que uma crise de dívida estivesse se aproximando, oito anos atrás. Só se opunham a qualquer coisa que pudesse ajudar a economia enquanto um democrata era presidente.

The New York Times, tradução de Paulo Migliacci

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