Priscilla Bacalhau

Doutora em economia, consultora de impacto social e pesquisadora do FGV EESP CLEAR, que auxilia os governos do Brasil e da África lusófona na agenda de monitoramento e avaliação de políticas

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Priscilla Bacalhau

Sem dados raciais não se constrói política pública

Sem acesso a esses dados, será impossível combater as persistentes disparidades

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Sem um diagnóstico étnico-racial, as mudanças por meio de políticas públicas nunca serão permanentes.
Não deveria ser surpresa para ninguém que o Brasil ainda apresenta inaceitáveis níveis de desigualdades étnico-raciais. Afinal, as nefastas consequências de séculos de escravidão negra e genocídio indígena não serão resolvidas só com políticas transitórias e ações isoladas.

Sistematicamente, os números mostram que as populações preta ou parda e indígena têm menor acesso a abastecimento de água, esgoto sanitário ou coleta de lixo. O recorte étnico-racial é relevante para analisar as condições de pobreza, insegurança alimentar, mortalidade materna, violência, encarceramento e tantos outros aspectos. Você pode não ter conhecimento sobre os dados oficiais, mas não é difícil inferir qual a cor de quem está em situação de vulnerabilidade social.

As desigualdades étnico-raciais persistem nas novas gerações. Desde o acesso e permanência na escola até os níveis de aprendizagem: crianças e jovens negros e indígenas saem prejudicados.

Segundo dados do Inep de 2021, 8 entre 10 jovens brancos de 19 anos concluíram o ensino médio, enquanto apenas 6 entre 10 jovens pretos o fizeram. A proporção de alunos brancos com aprendizado adequado em português e matemática chega a ser duas vezes maior do que a de alunos negros. Em um país em que mais da metade da população se declara preta ou parda, foi preciso uma década de cotas raciais no ensino superior para que a proporção de estudantes negros chegasse a ser equiparável à de brancos.

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3ª Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância, promovida pela ONU, em Durban, África do Sul, em 2001 - Divulgação ONU

Mudanças estruturais para abordar essas disparidades étnico-raciais não vão ocorrer sem um diagnóstico preciso. Por isso, a coleta de dados raciais não pode ser negligenciada, apesar das dificuldades e desafios éticos. Dados raciais frequentes e consistentes são imprescindíveis para identificar as desigualdades, planejar a alocação de recursos e monitorar e avaliar as políticas e intervenções. A falta deles pode dificultar a identificação de políticas ineficazes. Um diagnóstico racial expõe desigualdades estruturais a serem combatidas por meio de ações afirmativas e políticas antidiscriminatórias.

No campo educacional, indispensável para elaborar soluções sistêmicas para os problemas da sociedade, houve um recente retrocesso na divulgação de parte desses dados. Os dados raciais dos estudantes deixaram de ser divulgados, como forma de atender a LGPD. É preciso achar formas de preservar a privacidade dos dados, mantendo o compromisso com o diagnóstico e monitoramento constante das disparidades étnico-raciais. Sem acesso a dados raciais, será impossível combater as persistentes disparidades.

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