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Jornalista e autor de "Escola Brasileira de Futebol". Cobriu sete Copas e nove finais de Champions.

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Violência ocorre nos estádios, como em muitos outros cantos do Brasil

Num lugar em que a violência é defendida por governantes, o futebol não é mesmo uma bolha

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Os estádios brasileiros registraram uma noite de amor e de terror na quarta-feira (13). O Maracanã recebeu o segundo maior público do ano, com 68 mil espectadores para Flamengo 2 x 0 Atlético-MG. Do lado de fora, o ônibus do time mineiro foi apedrejado, duas torcidas uniformizadas do Galo brigaram, e houve tumulto na entrada.

O clássico Ceará 1 x 0 Fortaleza levou 48 mil torcedores ao Castelão. Horas mais tarde, as câmeras mostraram rojões atirados ao campo da Vila Belmiro, para atingir o goleiro Cássio, do Corinthians, alvo também de uma covarde tentativa de agressão pelas costas, por um suposto torcedor do Santos.

Há tempos, cobra-se que o futebol se apresente como vítima da violência, em vez de se deixar enxergar como vilão das cenas de barbárie, das quais não consegue se livrar há décadas.

Árbitro exibe faca recolhida no gramado em partida São Paulo x Palmeiras da Copa São Paulo de juniores
Árbitro teve de recolher faca do gramado em partida da Copa São Paulo deste ano, entre São Paulo e Palmeiras, na Arena Barueri - Reprodução/SporTV

Nos últimos dois anos, no entanto, dirigentes tentaram ultrapassar os limites da pandemia, o que produziu repetidos comentários de que o esporte não podia se comportar como uma bolha.

Não pode e não é.

A violência ocorre nos estádios, como em muitos outros cantos deste Brasil onde um dirigente partidário é assassinado no dia de seu 50º aniversário, em nome de fanatismo eleitoral.

Num lugar em que a violência é defendida em palanques de candidatos e discursos de governantes, o futebol não é mesmo uma bolha.

É triste perceber que, no momento em que se pode registrar a maior média de público nos estádios dos últimos 40 anos, os conflitos voltem a fazer parte do noticiário, assim como foram letras de música, no fim da década de 1980, período para o qual parecemos retornar. "Mais uma briga de torcida, termina tudo em confusão", cantavam os Titãs, em "Desordem", de Marcelo Fromer, Charles Gavin e Sérgio Britto.

"Jesus não tem dentes no país dos banguelas" era o nome do disco.

Quando esta terra sem dentes se tornou tão ávida por morder seus inimigos imaginários? Quando nos tornamos este lugar tão violento?

Essa pergunta parece ter um tom até otimista, quando respondida por gente mais realista, com a noção de que sempre fomos assim, belicosos.

O mesmo país que matou Marielle Franco é o do homicídio de Marcelo Arruda, o do atentado contra Carlos Lacerda e o do assassinato de Vladimir Herzog. Esteja você de um lado ou de outro do espectro ideológico, e certamente será contra qualquer uma dessas demonstrações de cólera.

Assim como um torcedor de mente sã já viu o ônibus do adversário chegar ao estádio e esboçou, no máximo, uma vaia. Ou gritou o nome de seu time, torcendo pelo fracasso –não pela morte– do rival.

O futebol não é uma bolha, e, não, essa não pode ser a razão de se aceitar passivamente um covarde tentando agredir o goleiro do Corinthians, apenas por torcer pelo Santos. Ele poderia ter uma faca nas mãos, como a encontrada no gramado da Arena Barueri, numa semifinal de Copa São Paulo de Futebol Júnior, em janeiro deste 2022.

O futebol sempre foi uma das razões de nos fazer sorrir, e torceremos para que isso aconteça outra vez depois das eleições, na Copa do Mundo em que o Brasil jogará como candidato ao título –não mais como favorito.

Hoje, estádios cheios dão até um esboço do velho país do futebol, cantado por Wilson Simonal e Milton Nascimento, às vésperas da Copa de 70, no auge da repressão e da tortura do governo Médici: "Brasil está vazio na tarde de domingo, né? Olha o sambão, aqui é o país do futebol".

Agora temos arquibancadas repletas de gente torcendo pelo sucesso de seus times e para sairmos íntegros deste imenso período de trevas.

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