Foi no dia 30 de junho de 2002, às 8 horas da manhã, há exatos 21 anos, a vitória que produziu esta frase na primeira página da Folha: "Brasil bate Alemanha por 2 x 0 e consolida hegemonia no futebol".
Neste aniversário do penta, só conseguimos perguntar por que não ganhamos mais. A maioridade do título coincide com a primeira conquista de Liga dos Campeões do Manchester City. Uma coisa não tem nada a ver com a outra –e tudo a ver.
O futebol mudou de endereço. Saiu da América do Sul e viajou para a Europa, dona de quatro das últimas cinco Copas.
O City é um clube árabe com sede na Inglaterra, campeão europeu escalando dois ingleses, dois portugueses, um brasileiro, um suíço, um holandês, um alemão, um espanhol, um belga e um norueguês, nascido em Leeds, Reino Unido.
Há 21 anos, a seleção tinha quatro paulistas, dois mineiros, um pernambucano, um gaúcho, um carioca, um paranaense e um nascido no Distrito Federal.
O mundo mudou mais do que o futebol.
Depois do caso Bosman, que transformou os clubes em seleções multinacionais, os craques brasileiros se globalizaram. O Brasil boleiro, não. Ronaldo, Rivaldo e Cafu sentam-se à mesa com a elite europeia. Nossos técnicos e presidentes de clubes, não. Apesar do sucesso de executivos, como Edu Gaspar, no Arsenal, e Thiago Scuro, agora no Monaco.
Aumentaram as nações capazes de jogar bem, como aconteceu antes no basquete, esporte em que o Brasil saiu do respeito internacional para o ostracismo. No futebol, seguimos na elite, mas perdemos para Croácia, França, Alemanha, Bélgica e Holanda.
Dá para melhorar.
Em 2001, um ano antes do título mundial contra os alemães, o Brasil perdeu de Honduras. Muitos profetas do apocalipse previram o fim. O capitão Carlos Alberto Torres dava entrevistas dizendo que o futebol brasileiro tinha chegado ao seu pior momento. Foi parecido quando o Brasil perdeu seu primeiro jogo de Eliminatórias, em 1993, para a Bolívia.
Todas as grandes crises da seleção foram resultado de renovações rápidas, sem transição de uma geração para outra.
A atual é de outra família. Não se trata de ausência de talentos. Eles existem. Saem cedo do Brasil para a Europa, mas continuamos descobrindo extraclasses.
É o único país com jogadores em todas as finais de Champions League no século 21. Mas só ganhou uma Copa no século.
Todo ano um torcedor europeu festeja um craque brasileiro.
E nós, nada.
Hoje faz 21 anos, a maioridade de nossa deficiência.
Comemoramos o predomínio na Libertadores, o melhor torneio do subúrbio do mundo. E ninguém torce por clubes brasileiros em Quito, Lima, Buenos Aires...
"Se não existisse a NBA nem o Campeonato Brasileiro, eu me associaria ao futebol do Brasil. É mais global do que o basquete dos Estados Unidos." A frase é de um investidor interessado em comprar a liga.
Há 21 anos, julgávamos o Brasil azarão da Copa, e a seleção foi penta. Ah, mas havia Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho. Sim, mas perdíamos para Honduras e, às vésperas da Copa, julgávamos que os bons daquele torneio eram Zidane, Figo e Batistuta.
Poucos acreditavam que Ronaldo seria capaz de fazer o que fez: oito gols, artilheiro e campeão.
Hoje, o que falta ao Brasil não são jogadores decisivos.
Ainda temos Vinicius Junior, Rodrygo, até Neymar.
Falta trabalho e coerência.
Hoje é dia de recordar a conquista de 2002.
Também de nos lembrarmos de que o futebol já entrou no século 21.
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