Renata Mendonça

Jornalista, comenta na Globo e é cofundadora do Dibradoras, canal sobre mulheres no esporte.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Renata Mendonça

Único dia que não é das mães é segundo domingo de maio

Críticas não cessam nem mesmo quando elas são supercampeãs

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

​Passou domingo, e hoje é mais um dia comum. O café já está na mesa, a criança já tomou banho, tomou a vitamina que a pediatra receitou, está com o uniforme da escola e com a mochila pronta. Dentro dela, tem o caderno, o lanchinho saudável, o remédio para febre, a escova de dente. Tudo pronto, é só levar para a escola. Você busca às 17h? Na volta, o jantar estará pronto.

Nesta semana, ela vai passar um dia fora, vai viajar a trabalho. A sogra pediu para ficar com a criança. "Não, ele dá conta." Uma folha de caderno e todas as instruções: "Acordar às 7h. Banho (pega o boneco do Homem-Aranha de que ele gosta para o banho). Dá a vitamina, três gotinhas. Pão, manteiga, uma fruta e um copo de leite para o café (tem tudo na geladeira)...". Tudo explicado e mastigado em uma página frente e verso.

"Ela foi viajar a trabalho, acredita? Deixou o filho com o coitado do pai."

No meio da tarde o pai reclama: "Você não avisou que estava acabando a manteiga. Estou no supermercado, precisa de mais alguma coisa?".

Precisa. Consegue ajudar a pensar? Às vezes, é "só" isso o que falta.

A norte-americana Serena Williams foi criticada por manter carreira no tênis após o nascimento de sua filha - Michel Bradley - 12.jan.20/AFP

Hoje não é mais domingo, dia das mães, é só todos os dias de todas as mães. Dias em que elas pensam em tudo e, quando não conseguem fazer tudo, contam com a ajuda deles para executar. Elas serão julgadas pelo que pensam, pelo que fazem, e principalmente quando não pensam ou não fazem. Eles serão exaltados pelo (pouco) que fazem, e poupados de críticas quando não fizerem.

O único dia que não é "das mães" é o segundo domingo de maio –o único em que, normalmente, ela não tem que fazer o café, o almoço, dar banho no filho. "Hoje você não faz nada." Mas em todos os outros dias...

O paizão é aquele que corresponde a 1% da expectativa que a mãe precisa cumprir.

A mãe que dá banho, alimenta o filho, leva ao médico, cuida dele quando está doente, ajuda nas tarefas da escola, é uma mãe. O pai que faz isso vai ganhar elogios a vida toda pelo básico. Já repararam que é mesmo O BÁSICO? Alimentar a criança que você colocou no mundo, garantir que ela esteja limpa, saudável, que estude... Não é o mínimo?

Mas a sociedade espera que a mãe faça isso ao mesmo tempo que espera que o pai não faça nada. Resultado: a mulher está sempre 100% sobrecarregada, enquanto o homem será glorificado se fizer qualquer coisa. E a glória dele terá, ao mesmo tempo, o dedo apontado para ela. "Olha que incrível, ele ATÉ dá banho." "Nossa, ela nem banho dá."

Percebem que, com essa lógica, a conta nunca vai fechar? A tal igualdade que buscamos nunca será alcançada enquanto as cobranças forem direcionadas apenas para as mulheres. A lei pode mudar e oferecer licença maternidade e paternidade igualmente divididas entre homens e mulheres (como acontece em países como Reino Unido, com a Licença Parental Partilhada), o pensamento das empresas poderá evoluir para não discriminar mães na hora das contratações, os banheiros de shoppings poderão oferecer a versão "família" para que homens também troquem a fralda de seus filhos... Mas, enquanto o dia a dia de julgamentos (vindos de todos os lados, diga-se) continuar, a mulher nunca será verdadeiramente livre para maternar em paz.

Porque, hoje em dia, do jeito que é, maternidade é sinônimo de culpa. Não é "padecer no paraíso", é "padecer" no purgatório mesmo, onde as mães estão para ser julgadas –e, normalmente, condenadas.

Até mesmo quando elas são supercampeãs as críticas não cessam. Serena Williams deveria ter parado de jogar para cuidar da filha. Tamires não deveria largar o filho com o pai ou com a avó para disputar uma Copa do Mundo. Que momento ruim Alex Morgan escolheu para ser mãe, não poderia esperar as Olimpíadas?

Tamires, lateral da seleção brasileira e do Corinthians, com o filho Bernardo
"Tamires não deveria largar o filho para disputar uma Copa" - Arquivo pessoal

O fardo está pesado e injusto. Vamos ajudar a aliviá-lo?

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.