Ricardo Araújo Pereira

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Ricardo Araújo Pereira

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Cientistas precisam de uma pessoa fulgurantemente mediana a seu lado

Admito outras perspectivas, mas, para mim, as aulas onde era mais fácil e compensador fazer perguntas idiotas eram as de biologia. 

Por exemplo: será que houve, no decurso da evolução humana, um momento em que nasceu o primeiro Homo sapiens quando todo o resto do mundo era ainda homem de Neandertal, professor? Quem seria esse desgraçado? Não devia ser fácil chegar à gruta e ver tudo sujo e desarrumado.

É possível que ele perguntasse: “Escutem, e se nós varrêssemos estas carcaças de animais e investíssemos num papel de parede, ou numas cortinas?” Muito provavelmente, os pais continuariam a comer uma banana, indiferentes.

Ilustração
Luiza Pannunzio/Folhapress

Talvez um primo lhe arremessasse fezes e ele dissesse: “A sério, Fábio? Estamos em pleno Paleolítico Médio e você ainda acha engraçado arremessar fezes?”

Normalmente, os professores prosseguiam com a matéria sem me esclarecer —e percebia-se nos seus olhos que, embora estivessem num estágio evolutivo bastante desenvolvido, crescia neles uma vontade bastante primitiva de me arremessar fezes. 

Mas eu fui reforçando a ideia de que os cientistas precisam de uma pessoa fulgurantemente mediana a seu lado, para lhes manter os pés na terra.

Essa teoria ganhou força quando, nesta semana, se soube que cientistas japoneses estão a estudar um modo de construir o primeiro elevador espacial. Isso mesmo: um elevador capaz de transportar pessoas e mercadorias entre a Terra e um satélite, por exemplo.

Eles estão preocupados com aspectos técnicos: como construir um cabo suficientemente forte para ligar o planeta a um satélite e suportar um elevador? Como garantir um centro de massa em órbita geostacionária (frase na qual só entendo as palavras “um”, “de” e “em”)? Faz falta, evidentemente, uma pessoa como eu, que faça as perguntas importantes:

1. Será ajuizado partir para o projeto do elevador espacial quando ainda não se inventou o micro-ondas produtor de frio, capaz de esfriar uma cerveja em segundos?

2. E no tocante à minha queda de cabelo? A ciência desistiu da minha alopecia?

3. Que tipo de conversa de elevador se espera que as pessoas mantenham num percurso tão longo? Eu tenho dificuldade em arrumar tema quando sou obrigado a partilhar o elevador com outra pessoa até ao oitavo andar.

São só alguns exemplos de questões que gostaria de colocar a esses cientistas, depois de garantir que eles não têm acesso a fezes.

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