O aparecimento fulgurante do até aqui desconhecido conceito de "tchutchuca do centrão" surpreendeu cientistas políticos de todo o mundo.
Vale a pena registrar um breve historial da ideia, enquanto os acontecimentos estão ainda frescos na nossa memória, para benefício de estudiosos e investigadores futuros.
O conceito foi postulado durante um debate que opôs o presidente do quinto maior país do mundo e um youtuber vestido com uma camisa do São Paulo Futebol Clube. Não costuma ser o ambiente em que surgem ideias políticas inovadoras, mas pode passar a ser.
Parece-me evidente que Montesquieu, Locke e Marx teriam produzido pensamento mais denso se tivessem tido a oportunidade de debater regularmente com um torcedor do São Paulo.
O produtor de conteúdos começou a discussão de um modo pouco imaginativo, argumentando que Bolsonaro era vagabundo, covarde e safado. O presidente do Brasil resistiu bravamente a responder e entrou na sua viatura oficial.
Mas depois o influenciador apelidou Bolsonaro de "tchutchuca do centrão", e foi aí que o presidente do Brasil saiu do carro para ir tentar confiscar o celular com que o youtuber filmava a cena.
Tendo em conta que todos pudemos ver o vídeo, é improvável que tenha conseguido. Não é a primeira vez que um dirigente político pretende apreender os meios com que os cidadãos exprimem e divulgam as suas opiniões. Acontece que os dirigentes políticos que têm essa inclinação não costumam fazer o confisco pessoalmente.
Eu sou um democrata, pelo que nunca fui fã da polícia política. Mas, uma vez que ela evitaria que nós víssemos o presidente do Brasil a lutar com um youtuber por causa de um celular, começo a ser sensível à sua utilidade. Nas eleições passadas, Jair Bolsonaro levou uma facada na barriga.
Nestas, já levou uma facada na dignidade. À barriga ele pôde ser operado; a dignidade não parece ter conserto.
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