Se me permitem, formulo uma teoria. As minhas filhas riem a dar gargalhada com os filmes de terror de há 40 ou 50 anos.
Isto não é ainda a teoria, calma. "Tubarão" lhes dá vontade de rir, "Halloween" parece ridículo, "Sexta-Feira 13" não as assusta de todo. Sempre que eu passava na sala, enquanto elas assistiam aos filmes, confirmava que, de fato, aquilo que me aterrorizava há umas décadas não me perturba agora.
Alguma coisa mudou no nosso medo —e, no entanto, não deixamos de temer tubarões ou assassinos. Talvez seja mais exato dizer que o medo se manteve, mas as astúcias que aqueles filmes usavam para dar medo perderam a sua potência.
Isso também acontece com o humor. O livro "Filógelos", a mais antiga coleção de piadas, tem várias histórias que faziam rir as pessoas do século 4º, mas já não nos fazem rir hoje.
Há muitas semelhanças entre o humor e o terror. Tanto uma piada como uma cena de terror produzem nas pessoas uma reação física violenta sem tocá-las. E, se nos assustam do mesmo modo duas vezes seguidas, o sobressalto não é tão grande, assim como não rimos da piada da segunda vez que a ouvimos.
Ora, sendo o humor uma estratégia para reagir ao medo, será que o fato de já não termos medo das mesmas coisas está relacionado com o fato de já não rirmos das mesmas coisas? Será que o modo como conseguimos, através do humor, debelar os nossos medos de 1980, também tirou força das piadas que operaram essa superação? Será que uma piada que luta com o medo e o vence também acaba derrotada?
Mais uma vez: o que mudou não foi o medo propriamente dito. Foi o seu ardil para infligir. O que já não nos assusta hoje nos filmes do passado é, por exemplo, a quantidade de vezes que o assassino está atrás da porta. Deixou de aterrorizar e passou a ser ridículo.
Uma porta abre e lá está ele, imóvel, à espera de atacar.
Talvez a gente tenha pensado melhor, passado o susto, e tenha acabado por compreender que, para causar terror, o assassino teve de passar largos minutos atrás de portas, quietinho, aguardando o momento de se abrirem, o que retira a dignidade da pulsão homicida.
É possível que esse dispositivo tenha sido usado demasiadas vezes de forma irônica, desde que os filmes foram exibidos a primeira vez, e tenha perdido agressividade, como um lobo que se deixou domesticar.
A teoria, finalmente, é esta: quem quiser fazer rir os seus contemporâneos deve investigar de que é que eles têm medo. A piada mais engraçada será, em princípio, sobre o medo mais profundo, o terror mais arrepiante, o maior pesadelo.
Provavelmente, vem aí muita comédia sobre os posts do Instagram que têm zero curtidas.
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