Quando leio as notícias segundo as quais os professores universitários pedem trabalhos aos alunos e recebem textos impecáveis, sem gralhas nem erros ortográficos, descobrindo assim que os alunos encomendam os trabalhos ao ChatGPT, fico naturalmente preocupado.
Preocupado e indignado. São alunos universitários. O futuro do país. E fazem isso.
Eles não têm o discernimento de acrescentar uma gralha aqui, colocar mal uma vírgula acolá, de modo a camuflar o fato de o texto ter sido escrito por uma máquina.
Que esperança podemos ter num mundo melhor se os homens e mulheres de amanhã não possuem a mais básica capacidade de enganar professores? Com que competências vão enfrentar o mercado de trabalho e a vida em geral? Esta geração está perdida.
No meu tempo não havia ChatGPT e estudávamos pelos apontamentos da Susana. E nos exames tínhamos de conseguir disfarçar que estávamos todos a copiar pelo Mendonça. Estes jovens de agora não querem esforçar-se para nada.
Isto são malandros que não sabem ser malandros. Dão mau nome à malandragem. O malandro é malandro por uma razão essencial: enganar os outros dá muito prazer.
Quem não entende a malandragem julga que o malandro é malandro para facilitar a sua vida. Ora, nem sempre isso acontece. Às vezes, dá mais trabalho ser malandro do que viver uma vida a que se costuma chamar honesta.
Por exemplo: mentir é muito cansativo. Alguém pergunta: "Você já leu tal livro?" E a gente diz: "Claro." Mas não leu. Segue-se um conjunto extenuante de tarefas. É necessário memorizar que, sempre que estivermos na presença daquela pessoa, para todos os efeitos lemos aquele livro.
Além disso, é preciso falar do livro que não se leu sem deixar que se perceba que não foi lido.
Parece difícil, mas é mais difícil do que parece. Não basta dizer frases genéricas, do gênero: "Trata-se de uma obra admirável". Há que ser mais preciso, não deixando de ser vago.
"Ah, sim, 'Os Irmãos Karamazov'. Não é possível entender a Rússia sem ele. Uma das tragédias da minha vida é não poder ler a versão original. Para captar de fato aqueles ambientes."
E daí passar para uma reflexão sobre a precariedade do acto de traduzir.
Daria muito menos trabalho ler o raio do livro. Ou admitir que não o lemos. Há muitos livros no mundo, não é vergonha não ter lido um. Mas, pelo prazer de enganar, todo o sofrimento vale a pena.
É um sacerdócio. Respeitem-no, jovens.
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