Confesso que não conhecia, salvo referências indiretas, o trabalho de Marília Mendonça. Gosto de música, meus rádios ficam ligados o dia inteiro, mas o gênero sertanejo nunca foi dos meus preferidos. Não sou hipócrita.
Penitencio-me como jornalista por não me aprofundar em um fenômeno musical internacional. Não para falar bem ou criticar, mas por desconhecer a dimensão da cantora/compositora e tentar entender os motivos de seu sucesso.
Então passei o fim de semana ouvindo alguém que eu desconhecia de fato. Assisti a inúmeros especiais dedicados a alguém que tão jovem foi vítima de tamanha tragédia.
Descobri quanto tempo perdi dedicado à política, bandidos engravatados e candidatos a tanto –embora estes sejam, infelizmente e por dever de ofício, minha matéria-prima.
Marília trouxe à tona em suas composições e canções um universo escondido por trás de um machismo insuportável, herdeiro do escravismo e patriarcalismo que até hoje sobrevivem no Brasil.
Veja só: quem melhor interpretava os sentimentos das mulheres, segundo celebravam (e celebram) "especialistas de ocasião", até então era um homem. Chico Buarque de Hollanda.
Mas nada se compara à cobertura canhestra que telejornais e colunistas de segunda, terceira ou quarta.
Luciano Huck superou-se a si mesmo na própria insignificância no programa deste domingo. "Ela estava tão magrinha", referindo-se ao shape de Marília. Como se isto fosse o importante na carreira vitoriosa que ela trilhou desde a adolescência.
Sou de uma geração em que as "formas" nos foram impingidas como exemplos de beleza e sucesso.
Felizmente os tempos querem mudar e estão mudando. O empoderamento feminino vem se impondo. Não era sem tempo.
Em séculos passados, o homem gordo e barrigudo era sinal de sucesso. Depois, as modelos anoréxicas viraram exemplo de triunfo. Hoje, pensávamos que o caráter, afeto e o companheirismo tinham superado tudo isto.
Nada disso. Temos Lucianos Hucks espalhados e alimentados por um retrocesso sem precedentes. Gente como JMB (dito Bolsonaro) gabou-se de ter um apartamento em Brasília para "comer gente".
Imaginem a situação: "apesar do nariz avantajado, perfil discutível, de ser herdeiro de milionários e mal manejar o português, Luciano Huck nos deixou".
O que falariam nossos "especialistas"?
Angélica que se cuide com a balança.
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