Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Rodrigo Zeidan

CPI pode reverter danos do governo ou ser o último suspiro da democracia brasileira

O que está acontecendo hoje no Brasil, no Reino Unido e nos EUA é uma reação dos Estados contra a destruição das instituições públicas

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"Leões liderados por asnos, repetidamente." Essa foi a frase que Dominic Cummings, ex-principal conselheiro do primeiro-ministro britânico, usou para descrever a resposta à pandemia por Boris Johnson e seus ministros.

O Parlamento inglês criou um inquérito, equivalente a uma CPI no Brasil, para investigar as respostas do governo inglês à pandemia. Os leões seriam os técnicos, na maioria funcionários públicos de carreira, que trabalhavam incessantemente para criar planos de ações para impedir o alastramento do vírus e os asnos os políticos do alto escalão do governo.

Cummings acusou Boris Johnson de dizer que preferiria ver pilhas de mortos a instituir um terceiro lockdown (o que acabou acontecendo de qualquer maneira, em janeiro deste ano) e denunciou o ministro da Saúde, Matt Hancock, por mentir reiteradamente aos seus subalternos e à população.

Essas mentiras incluiriam a promessa de que qualquer paciente idoso que recebesse alta seria testado antes de poder voltar ao asilo em que morasse. Mas milhares de pacientes não foram testados e, em razão disso, os casos de Covid nos asilos explodiram. As mortes de dezenas de milhares de idosos poderiam ter sido evitadas se o governo simplesmente tivesse feito o que prometeu.

O inquérito parlamentar no Reino Unido não é um fato isolado. É parte de reações institucionais aos descalabros dos líderes contraliberais eleitos nos últimos anos.

No Brasil, temos uma tendência de analisar processos políticos locais como se estivéssemos isolados do resto do mundo, mas não é bem assim.

O golpe militar no Brasil teve correspondentes em outros países latino-americanos, e as eleições de Collor, Lula e do atual presidente foram influenciadas por processos políticos similares no resto do mundo. Collor, no Brasil, Menem, na Argentina, Gortari, no México, Fujimori, no Peru, e Pérez, na Venezuela, foram eleitos ao prometer reformas de mercado para combater inflação e outras mazelas.

Lula subiu ao poder na mesma maré rosa que trouxe presidentes de esquerda como Kirchner, na Argentina, Chávez, na Venezuela, e Evo Morales, na Bolívia. E o atual presidente chegou ao topo no Brasil com outros políticos contraliberais, como Trump, nos Estados Unidos, Erdogan, na Turquia, Duterte, nas Filipinas, Johnson, no Reino Unido, Salvini, na Itália, e Orbán, na Hungria.

O que está acontecendo hoje no Brasil, no Reino Unido e nos EUA, no qual o equivalente a uma CPI está para ser instalada para investigar a invasão ao Capitólio no início de janeiro, é uma reação dos Estados contra a destruição das instituições públicas, que é o principal objetivo do contraliberalismo. Mas isso não é sinal de que o contraliberalismo está se esgotando. Em alguns países, os políticos contraliberais mais radicais, de extrema direita, venceram. Na Hungria e na Turquia, Orbán e Erdogan conseguiram concentrar mais poderes e limitar as ações da mídia e de políticos de oposição.

CPIs e inquéritos parlamentares não são o mecanismo ideal, mas são as formas mais diretas para punir governos populistas e reverter o desmantelamento dos instituições democráticas.

No Brasil, evidências do descaso do governo não faltam. Por mais torta que se possa parecer, haja vista a qualidade dos nossos políticos, a CPI da pandemia pode reverter alguns dos danos do governo de extrema direita. Ou pode terminar sendo o último suspiro da democracia brasileira.

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