Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Rodrigo Zeidan

Voucher não é solução para o ensino

Vouchers é como cloroquina; serve para outros contextos, mas não para o que o governo quer

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Seria bom se o Ministério da Economia tivesse um plano de privatizar tudo e entregar o Brasil ao capital internacional. Pelo menos assim saberíamos qual o plano para tirar o país do caos em que se encontra.

Mas o ministro e seus assessores não estão lá a mando de ninguém. Eles realmente acreditam nas suas ideias mal formuladas. No mais recente ataque à educação pública, Guedes tentou vender a ideia de vouchers como solução para o país.

Mas vouchers são a cloroquina para a educação no Brasil, um remédio que serve para outros contextos, mas não para o que o governo quer. A ideia é até atraente: entregar na mão dos pais um vale de um certo valor para que as famílias matriculem seus filhos na escola que quiserem.

A liberdade de escolha geraria competição das escolas para atrair os alunos que tiverem esse vale, e todo o mundo, desde os alunos até o governo, que não precisaria investir tanto no ensino público, ganharia. Mas não é bem assim.

A literatura científica mostra que vouchers, quando úteis, servem para expandir o sistema de ensino em países bem pobres, nos quais mesmo em áreas urbanas com alta densidade falta estrutura escolar básica.

As experiências em países de renda média, como o Brasil, são ruins. Afinal, nosso problema não é universalização, e sim melhoria da qualidade do ensino.

Para esse problema, a introdução de subsídios diretos às instituições privadas é sempre inferior a uma reforma do sistema de ensino que requeira o mesmo custo político. Mesmo nos Estados Unidos, onde há melhores reguladores, tais programas não funcionam bem para aumentar a qualidade do ensino; a “melhoria”, quando existe, é fruto do fato de as escolas subsidiadas excluírem muitos alunos vulneráveis.

Ensino não é serviço homogêneo, e há gigantesca assimetria de informação entre escolas, que conhecem a qualidade do serviço que prestam, famílias e governo. Um sistema de vales é tão bom quanto as instituições que regulam o mercado, garantindo qualidade básica e que não haja fraude ou discriminação.

Para várias escolas, aceitar um aluno com dificuldades, mesmo que ele viesse com o voucher dado pelo governo, pode resultar na queda do estabelecimento nos rankings. É isso que encontram Bergman e McFarlin (2020), em um estudo com 6.452 escolas privadas americanas. As escolas privadas custeadas com dinheiro público (charters) respondem muito menos a consultas de alunos mais vulneráveis, pois eles dariam mais trabalho. Aí é moleza; receber dinheiro público para prestar serviço somente para os melhores alunos.

Ainda, para as piores escolas, valeria a pena aceitar qualquer um, mas isso levaria à piora do sistema de ensino, com escolas ruins botando dinheiro público no bolso, mas sem entregar quase nada para os alunos. É isso que aconteceu na Louisiana, nos Estados Unidos. Mills e Wolf (2017) mostram que os alunos que receberam vouchers em um dos estados mais pobres dos EUA tiveram pior desempenho em línguas e matemática do que se tivessem ficado nas escolas públicas (ruins) em que estavam.

No Chile, Aguirre (2021) não encontra evidência de que vouchers aumentem os resultados dos alunos que os usam, o que também é corroborado por Guarantz (2019).

Em teoria, teria como esses vales darem certo? Sim, mas isso dependeria de trabalho sério, regulação bem-feita e monitoramento de qualidade. E esse governo sabe disso. Mas prefere jogar para a plateia. Sem competência técnica, resta repetir bordão sem conteúdo.

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