Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Casa Verde e Amarela é muito pior que o Minha Casa Minha Vida

Programa anterior não era perfeito, mas substituto tem pouco recurso e não visa reduzir déficit habitacional

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Cinco milhões de casas depois, mais de R$ 130 bilhões de subsídios diretos e R$ 100 bilhões do FGTS, o que podemos concluir do programa Minha Casa Minha Vida? A resposta não é simples, mas, em um país com péssimo uso do dinheiro público, o saldo é positivo.

Na discussão sobre déficit habitacional, até os Estados Unidos entraram no jogo. O governo americano acabou de anunciar um plano de subsidiar a construção de 100 mil casas populares. Lá, o déficit habitacional é gigantesco, mas concentrado geograficamente nas áreas mais produtivas do país, como Nova York e San Francisco. Há estimativas de que o país perca US$ 1,6 trilhão por ano por causa de regras de zoneamento ruins que impedem construção de imóveis nos lugares mais ricos.

No Brasil, a situação é mais complexa, pois a origem é em renda e crédito: quem é mais pobre tem muito mais dificuldade em conseguir um empréstimo imobiliário e se comprometer com o pagamento.

O presidente Bolsonaro visita unidade habitacional em Juazeiro do Norte (CE) - Marcos Corrêa/PR - 13.ago.2021/PR

Nesse ponto, o MCMV funcionou. Entregou crédito a quem não tinha acesso. Milhões de imóveis foram construídos. Ninguém foi obrigado a se mudar para áreas para as quais não queria ir. Para evitar muito desperdício, havia condições. Os terrenos deveriam estar totalmente regularizados, e a Caixa Econômica só liberava a construção depois de várias unidades estarem vendidas e com financiamento aprovado. Ou seja, não financiamos prédios fantasmas.

Os riscos operacionais não ficavam dentro do setor público. Legalização era problema da construtora, assim como oferecer imóveis onde as pessoas quisessem morar.

Todas as regiões do país foram contempladas pelo programa. Segundo relatório da Secap, os subsídios para o público de menor renda se concentraram nas regiões Nordeste e Sudeste, enquanto nas demais faixas de renda ficavam no Sul e no Sudeste.

O programa estava longe de ser perfeito e, como tudo no Brasil, foi feito na correria. Os subsídios públicos cresceram rapidamente até 2015, minguando desde então.

O programa tinha como meta construir 1 milhão de moradias, mas entregou cinco vezes mais. À primeira vista, isso pode parecer bom, mas não é. Por exemplo, para lidar com a explosão de novos imóveis, criaram-se até loterias para contemplar beneficiários.

Chagas e Rocha (2019) mostram que as loterias acabaram gerando incentivos para muitos beneficiários saírem do mercado de trabalho formal, por irem morar longe dos empregos onde poderiam estar trabalhando.

A falta de coordenação entre as esferas governamentais levou à perda de muitas oportunidades. Por exemplo, seria muito melhor a construção de milhares de moradias em áreas onde estados e municípios entrassem com a contrapartida de melhorar a infraestrutura local.

Bandeira e Reyes Junior (2021) mostram que o programa gerou mais valor nos municípios com melhor gestão de infraestrutura. Casa própria só é algo bom, a longo prazo, se a região se desenvolver junto; senão, vira um abacaxi.

O Minha Casa Minha Vida acabou por decisão do governo, já que era dependente de despesas primárias discricionárias. Seu substituto, o Casa Verde e Amarela, é muito pior, com ínfimos recursos que agora também podem ser usados para reformas, retirando a essência do programa, que é reduzir o déficit habitacional.

O governo se preocupa com forma, não conteúdo. Um dia vamos aprender: não há melhor política pública que entregar dinheiro e crédito diretamente aos mais pobres, sem incertezas e com planejamento.

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