Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Rodrigo Zeidan
Descrição de chapéu Apple

Circuitos fechados

Trabalhadores da Foxconn na China podem definir ritmo de retomada do Brasil em 2023

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O pleito dos trabalhadores da Foxconn, maior fornecedora da Apple na China, pode determinar o ritmo de recuperação da economia brasileira em 2023. A razão para isso? Se as fábricas chinesas fecharem, pressionarão ainda mais os preços de produtos industriais no mundo, e os juros ficarão altos por mais tempo ao redor do planeta.

A recente onda de inflação mundial tem três causas: disrupção de cadeias globais de suprimento (pela pandemia, pela Covid zero na China e pela Guerra da Ucrânia), ajuste das empresas a mudanças permanentes nos padrões de consumo e o efeitos acumulados de anos de política monetária frouxa, culminando nos trilhões de dólares "impressos" por bancos centrais durante a pandemia.

A inflação mundial começou a subir em 2021, mas até o início deste ano não havia consenso se ela seria temporária ou resistente. Os juros americanos de curto prazo estavam em 0,05% em janeiro, e os títulos de 30 anos pagavam somente 2% ao ano. Mas em março veio o primeiro choque do Federal Reserve, que desde então tem feito aumentos periódicos de cerca de 0,75 ponto percentual nos juros básicos da economia.

letreiro azul em que se lê Foxconn, com orientais por perto
Fachada de fábrica da Foxconn, a maior fabricante de iPhones do mundo. - AFP

Em julho, os títulos com vencimento em um mês já estavam pagando 1,75%, e os de longo, 3%. Hoje, os juros de três meses estão em 4,75%, e os de 30 anos, em quase 4%, o dobro do começo do ano.

Ainda assim, os juros reais americanos estão negativos, com a inflação de 7,7%, maior que o retorno dos títulos públicos. O mundo hoje acompanha cada anúncio da inflação americana com suspense e medo, pois, se ela não baixar, o Fed vai continuar subindo os juros, com chances de jogar o mundo em uma recessão.

E isso nos traz de volta aos chãos de fábrica na China. Muitos trabalhadores estão insatisfeitos com a possibilidade de ter de trabalhar sob regime de circuito fechado, enquanto o país tenta lidar com o aumento dos casos de Covid, resultado do relaxamento de algumas regras da política de contenção do vírus. Há até pouco tempo, as autoridades chinesas eram claras: a prioridade era a política de Covid zero, custasse o que custasse. Por meses, fábricas em Xangai ficaram paradas, embora o governo local tenha conseguido manter o porto aberto. Como ele fez isso?

Os trabalhadores passaram a morar dentro da área do porto, não podendo ir para casa até que o lockdown, que durou cerca de 60 dias, acabasse. Isso valeu para todos os setores essenciais, incluindo empresas de água e energia.

Indústrias que quisessem continuar operando durante o lockdown teriam que pedir uma licença e conseguir que seus funcionários concordassem em ficar em isolamento até o relaxamento do lockdown. E, diferentemente do que pensam muitos brasileiros, ninguém é obrigado a aceitar. Alguns bancos pagaram diárias de R$ 800 para seus funcionários de TI ficar no emprego. Outras empresas ofereceram quatro vezes o salário para quem aceitasse trabalhar em regime de plantão.

Muitos lockdowns locais estão pipocando. Na China, não há direito de greve e sindicatos formais, mas há, como muita coisa no país, ações coletivas informais que pressionam empresas e autoridades locais. E é isso que está acontecendo. Funcionários da Foxconn querem melhores condições e maior salário para trabalhar em regime de circuito fechado. E isso vai se repetir em várias outras indústrias da China.

O desemprego no Brasil depende de circuitos fechados em fábricas chinesas via juros americanos. Não há melhor exemplo de globalização.

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