Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Rodrigo Zeidan
Descrição de chapéu inflação juros

Dinheiro na mão não é vendaval

Aprenda a gerenciar liquidez, a olhar valores se acumulando, sem que você faça nada

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"Não, não faça isso, não se descapitalize inteiramente", disse para uma executiva que tinha vendido um apartamento em Belo Horizonte ia usar todo o dinheiro para comprar outro no Rio. "Não dá. Dinheiro na mão é vendaval", ela respondeu.

O que há em comum entre a potencial quebra da FTX, a mega desvalorização do iene, a demissão de 11 mil funcionários da Meta (Facebook) e o amor do brasileiro por comprar tijolos? Gerenciar liquidez é difícil e ainda mais complexo quando há transição de regime de taxas de juros.

Por mais de dez anos, os mercados financeiros foram inundados com liquidez quase infinita. Juros negativos, bancos centrais "imprimindo" trilhões de dólares indiretamente através de quantitative easing, novas criptomoedas surgindo diariamente, e empresas passando de US$ 1 trilhão de valor de mercado se tornaram comuns.

Mas com os juros americanos se aproximando de 5% ao ano e uma recessão mundial à vista, não há mais dinheiro fácil.

mãos seguram cédulas de real
Cédulas de real. Papel Moeda. - Gabriel Cabral/Folhapress

No Brasil, mesmo em períodos de bonança a maioria das pessoas e organizações têm dificuldade de gerenciar liquidez. O dinheiro coça no bolso e são raras as empresas que se mantém líquidas e são criteriosas em projetos de investimento.

Me recordo de uma família que concordou em vender, por quase R$ 1 bilhão, a principal empresa do grupo, mas só se todos concordassem em investir TODO o capital em um novo projeto. O medo era que a família não fosse saber gerar recursos aplicados no mercado financeiro, com os membros brigando constantemente para botar a mão na grana.

Qualquer bom gestor de investimento sempre tem parte do seu fundo em ativos de altíssima liquidez. No Brasil, ainda temos a vantagem de poder comprar títulos públicos com valorização diária, baixos custos de transação e liquidez altíssima. Ainda assim, a maioria dos brasileiros não conseguiria manter grande parte da sua riqueza ao seu alcance 24 horas por dia.

Parte disso é ainda influência da hiperinflação. No passado, comprar tijolo ou achar outra forma de imobilizar patrimônio era a única forma de se proteger do constante aumento de preços (para quem não sabia operar no overnight). Outra parte é falta de educação financeira.

O mais interessante é que os juros no Brasil são absurdamente altos. Isso deveria fazer as pessoas e empresas buscarem manter significativos colchões de liquidez, mas o oposto acontece. Dinheiro no caixa das empresas coça, e quando as pessoas mantêm uma reserva, normalmente o fazem em algum instrumento financeiro ruim, como caderneta de poupança.

No mundo, a saída do regime de juros quase zero está sendo problemática para várias entidades. Sem dinheiro barato quase infinito, empresas reveem planos de investimento e vários projetos de criptomoedas são abandonados. Antes, a FTX poderia conseguir empréstimos; agora, Sam Bankman-Fried deve seguir o caminho de Eike Batista como ex-bilionário.

Não é coincidência que Musk esteja correndo para reduzir custos no Twitter; a empresa tem que pagar mais de US$ 1 bi de juros anualmente pela aquisição alavancada.

Hoje, basicamente, só o Japão mantém juros a zero, o que gera grande pressão sobre o iene.

Se há uma lição dessa crise é: aprendam a gerenciar liquidez. A olhar valores se acumulando, sem que você faça nada. Diga não a projetos, a não ser que eles sejam realmente excelentes. Dinheiro na mão não é vendaval. Na verdade, "cash is king" (dinheiro é rei). Tenha o seu reino.

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