Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Rodrigo Zeidan
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Enem Fies

Desenhando mercados

Como a área desenho de mercados pode ajudar a melhorar a lei de cotas nas universidades brasileiras

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A lei de cotas em universidades federais brasileiras é sucesso mundial na democratização do acesso ao ensino superior. Mas ela pode ser melhorada, pois pode resultar em injustiça para os candidatos que optam pelas vagas reservadas.

A concorrência para essas vagas pode acabar sendo maior do que para as vagas abertas, de ampla concorrência, resultando em uma situação inesperada: a nota do Enem necessária para ser aprovado pelas vagas reservadas para cotistas é maior do que para ser aprovado pelas vagas abertas.

Mão de uma pessoa negra escreve no caderno
Lei de cotas no Brasil é sucesso mundial, mas ainda pode melhorar - Zinyange Auntony - 18.jul.2022 / AFP

De fato, só no primeiro semestre de 2019, mais de 10 mil candidatos cotistas foram reprovados, mesmo tendo nota suficientemente alta para serem aprovados se não tivessem optado por algum tipo de cota. A boa notícia é que esse problema é fácil de resolver, e já existe um projeto de lei no Senado, 2017/23, que eliminaria por completo esse problema, baseado nos trabalhos de Aygün e Bó (2021) e Bó e Senkevics (2023).

A análise e solução para esse problema na regra usada na implementação da lei de cotas é um exemplo de uma área da economia chamada desenho de mercados. O sucesso dessa área é confirmado pelos recentes prêmios Nobel de economia nos anos 2007, 2012 e 2020.

Um dos fatores que distinguem o desenho de mercados de outras áreas da economia é que muitos dos seus desenvolvimentos resultam em aplicações diretas das técnicas desenvolvidas nela. As regras para os leilões de espectro de rádio para 5G nos EUA, por exemplo, foram desenhadas de forma a possibilitar que diversas empresas pudessem operar em diferentes regiões, mas sem resultar em "buracos" na cobertura que elas oferecem.

Nessa área da economia, modelagem matemática e teoria dos jogos são usadas para entender de forma precisa as consequências de diferentes regras que determinam "quem vai receber o quê".

Médicos realizam transplante; área de desenhando mercados é utilizada com sucesso para esses procedimentos nos EUA - Christophe Archambault - 08.fev.2023 / AFP

Outro exemplo de sucesso de aplicação de desenho de mercados é o da implementação do transplante de rins de doadores vivos, como membros da família. No passado, se uma pessoa precisasse de um rim e não houvesse membro da família com rim compatível para doação, a única solução era esperar a doação de rim de alguém com morte encefálica.

Mas usando um modelo matemático que antes era usado para determinar a alocação de estudantes para escolas, pesquisadores desenvolveram um sistema de doações pareadas; membros de uma família podem doar rins para outras, desde que compatíveis, enquanto o familiar que precisa de um rim recebe o de outro doador vivo compatível. Só nos EUA, centenas de transplantes por ano tornaram-se possíveis através dessa nova metodologia.

No Brasil, existem muitas oportunidades para a utilização de desenho de mercados para ampliar o acesso a serviços públicos. Uma integração inteligente do Sisu, Prouni e Fies tem um enorme potencial de atender melhor as diferentes necessidades dos alunos, ao mesmo tempo em que amplia o impacto de ações afirmativas.

Melhorar as regras de programas como o Mais Médicos pode ampliar o atendimento médico em áreas mais remotas ao levar em consideração as preferências e objetivos profissionais de doutores. Inscrições para o ensino fundamental e médio podem também se tornar mais simples e previsíveis.

Um melhor desenho de mercados salva vidas, além de aumentar a eficiência do uso de recursos escassos. Requer muito rigor matemático e criatividade científica, mas é para isso que fazemos ciência.

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