Rômulo Saraiva

Advogado especialista em Previdência Social, é professor, autor do livro Fraude nos Fundos de Pensão e mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP.

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Risco do INSS em alongar o pagamento da revisão da vida toda

Governo busca acordo para ter mais prazo para pagar, como fez com a revisão do artigo 29, que demorou dez anos

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Uma vez aprovada a revisão da vida toda no STF (Supremo Tribunal Federal), o governo começa a negociar o prazo do seu pagamento. A exemplo do que aconteceu nas duas últimas grandes revisões previdenciárias que passaram no Supremo, no caso a revisão do teto e a do artigo 29, a da vida toda também tem repercussão geral, o que gerará mobilização do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) em todo território nacional. Diante do seu caráter multiplicador, o ministro da Previdência, Carlos Lupi, se antecipou e quer um acordo no Supremo para o INSS pagar a revisão no âmbito administrativo, ao que tudo indica em prazo alongado.

Ministros do STF participam da Sessão Solene de Abertura do Ano Judiciário de 2023 no plenário do Supremo Tribunal Federal.
Ministros do STF participam da Sessão Solene de Abertura do Ano Judiciário de 2023 no plenário do Supremo Tribunal Federal. - Rosinei Coutinho/SCO/STF

Como a decisão do STF é praticamente irreversível, a demora em colocar a revisão em prática nas agências previdenciárias pode tornar a conta mais cara. Na verdade, a conta sairá cara de qualquer forma, pois se o INSS tomar a iniciativa de aplicar a revisão amplamente no âmbito administrativo precisará fazer ajustes técnicos e operacionais, contratar mais funcionários, ajustar rotinas e o sistema de informática, fazer milhares de cálculos e finalmente pagá-los.

Se a revisão previdenciária é materializada judicialmente, a demora no reconhecimento do direito implica gastos como correção monetária, juros, eventuais perícias, honorários advocatícios e despesas com a máquina pública em movimentar a equipe de representantes jurídicos do INSS para a defesa em diversos processos.

Todavia, embora a conta do reconhecimento administrativo aparente ser mais barata do que a judicial, quando o INSS toma a dianteira em aceitar o direito automaticamente nas agências –mesmo correndo o sério risco de vários saírem com erro– tal atitude garante o acesso espontâneo de pessoas que não teriam o interesse em procurar a Justiça, seja por desconhecimento, falta de documentação, medo ou displicência. Não é por outra razão que historicamente o INSS tem a postura passiva e resistente em reconhecer alguns direitos, pois sabe que nem todos resolvem acioná-lo –administrativa ou judicialmente.

Recentemente, o instituto disponibilizou na plataforma Meu INSS um botão específico sobre a revisão da vida toda, para facilitar os aposentados a localizarem essa demanda. Mas o recurso tecnológico é meio inútil neste atual momento, já que administrativamente ainda não se autorizou a efetivação da revisão em larga escala. Caso utilizada, a solicitação de revisão praticamente ficará hibernando, embora servirá para marcar os efeitos retroativos financeiros no âmbito administrativo.

Por isso, os aposentados têm buscado o Judiciário. Ao ajuizar as ações, e com o seu deferimento imediato pelo juiz, crescem as demandas para o INSS cumprir a implantação judicial da revisão, embora o corpo de funcionários da autarquia continue deficitário há anos.


Ao estilo do famoso ditado "devo não nego, pago quando puder", o possível acordo que o INSS busca costurar, a fim de pagar a revisão da vida toda, não é prioritariamente uma forma de baratear custo, mas sobretudo de alcançar maior prazo para fazê-lo, a exemplo do que aconteceu na revisão do artigo 29.

Apesar dos esforços do INSS em tentar sensibilizar o STF, como fez na última petição no processo da revisão da vida, quando disse que poderia surgir um "estado de congestionamento e demora excessiva", a verdade é que historicamente a autarquia é mal estruturada para atender a qualquer tipo de revisão previdenciária. Falta funcionário público e o prazo máximo de 60 dias para finalização de processo é uma ficção legal, costumeiramente violada.

Os exemplos do passado evidenciam que os direitos previdenciários reconhecidos no STF precisaram de um incentivo compulsório para o INSS sistematizar sua aplicação.

No caso da revisão do teto, em 8 de setembro de 2010 o STF por maioria reconheceu a possibilidade de aumentar a aposentadoria com base nos novos tetos modificados pelo governo federal. Oito meses após, diante da demora do INSS em aplicar a revisão no país, o Ministério Público Federal e o sindicato dos aposentados ajuizaram a ACP (ação civil pública) 0004911-28.2011.4.03.6183 para forçar o INSS a reconhecer automaticamente no âmbito administrativo, no prazo de 90 dias, sob pena de multa de até R$ 10 mil a cada benefício não revisado.

Em 2012, a ação civil pública 0002320-59.2012.4.03.6183/SP foi usada novamente para pressionar o INSS em proceder com a revisão automática dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, intitulada como revisão do artigo 29. O problema foi o cronograma de pagamento das diferenças que surgiu desse processo. O prazo negociado demorou dez anos (de 2013 a 2022) para que o INSS pagasse a quem deve. Com latente prazo, muitos beneficiários acabam morrendo no meio do caminho ou passando necessidade financeira sem o respectivo aumento.

O receio é que a solução adotada na revisão do artigo 29 se repita na revisão da vida toda, já que foi praticado naquele um calendário para lá de demorado. Como a verba previdenciária tem o caráter alimentar, não é justo nem razoável que o aposentado se submeta a prazo tão espichado, caso se repita o que aconteceu no passado. O calendário de pagamento da revisão do artigo 29 implicou uma espera administrativa superior ao tempo de resposta de muitos processos judiciais. Espera-se que o governo não queira passar a vida toda para pagar a revisão de nome igual.

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