Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

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Ruy Castro

Beber "bem" ou beber "mal"

Por que alguns podem tomar duas garrafas de vodca por dia e outros se embriagam com uma cerveja?

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Leio nas folhas que, segundo pesquisa, 6 milhões de brasileiros consomem álcool "em excesso" e correm risco de dependência. Leitores afirmaram que o problema está aí, no excesso. Segundo eles, todo bebedor deveria saber a "hora de parar" —ou seja, quantos drinques o farão desfrutar apenas os prazeres da bebida, como uma deliciosa alteração de consciência, evitando beber de forma a sofrer os efeitos adversos, como o porre, os vexames e a ressaca.

Mulher segura um copo com bebida alcólica
Seis milhões de brasileiros, ou 4% da população adulta, consomem álcool em excesso e correm risco de dependência - Agência Einstein

Isso significa que, depois de chegar àquele estado de alteração, o bebedor voltará magicamente à lucidez, a qual lhe soprará que está na "hora de parar". Tal crença supõe que a humanidade se divide entre os que "sabem beber" e os que "bebem mal", e que todos têm o mesmo grau de tolerância ao álcool. Mas, se fosse assim, como se explica que alguns consigam ingerir duas garrafas de vodca por dia sem demonstrar embriaguez, enquanto, para outros, essa quantidade é absurda, impensável? E por que alguns se embriagam com algumas cervejas enquanto, para outros, a cerveja só serve para fins urinários?

A resposta é: porque as pessoas são diferentes. Estima-se que, na maioria dos países, 15% da população tenham alta tolerância ao álcool, enquanto, para os outros 85%, ele é um tóxico e elas só conseguirão bebê-lo no seu limite —ao ultrapassar esse limite, sentir-se-ão tão mal que pensarão duas vezes antes de repetir a experiência. Donde "a hora de parar" não tem a ver com "saber beber". É orgânico.

Ironicamente, os grandes candidatos à dependência são aqueles a quem o álcool parece não fazer mal. O fato de "beberem bem", de manterem a dignidade e quase nunca terem ressaca não impede que a doença se instale silenciosamente neles.

Como dizia Scott Fitzgerald, primeiro você toma um drinque. Depois, o drinque toma um drinque. E, por fim, o drinque toma você. Mas, para aqueles 15%, esse dia demora a chegar.

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